Nota de repúdio à aprovação do projeto de lei sobre “abuso de autoridade”
15 de agosto, 2019
A ADPESP vem a público repudiar veementemente o projeto de lei 7596 de 2017. Este traz verdadeiro desserviço não só as autoridades públicas do sistema penal, notadamente policiais civis, mas principalmente à própria sociedade brasileira. Numa época em que se espera recrudescimento no combate ao crime em todas as esferas, os nobres deputados trilham vertente oposta.
O caminho correto para o Brasil é o fortalecimento de suas instituições policiais e a certeza da punição para os criminosos.
É no mínimo surpreendente que o Parlamento – votado para refletir e traduzir a vontade popular – acabe por aprovar um projeto de lei que, pasmem, criminaliza hipóteses de uso de algemas, condução coercitiva de investigados e busca, apreensão domiciliar e outras condutas que venham a limitar ou de qualquer forma amedrontar quem arrisca sua vida na colheita de provas apta a tirar de circulação os infratores da lei. Importante frisar que a ADPESP e os delegados de polícia reiteram seus compromissos com a estrita legalidade e a punição severa aos excessos cometidos no exercício da função pública ou fora dele. Entretanto, discutir debater e aprovar temas como esses fortalecem a criminalidade inclusive as organizações criminosas que pululam no território pátrio.
Espera-se agora que o Excelentíssimo Senhor Presidente da República tenha a sensibilidade e o patriotismo necessários para vetar o projeto de lei 7596-2017.
Gustavo Mesquita Galvão Bueno
Presidente da ADPESP
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Em vez dessa nota de repúdio o Exmº Presidente da ADPESP , melhor faria discorrendo objetivamente sobre os pontos da aludida lei que prejudicarão a atividade das policias civis?
De toda essa grita dos operadores do direito , é lamentável verificar que um Juiz tem medo da interpretação de outro magistrado, que um Promotor não confia na boa-fé processual dos colegas e que Delegados, por sua vez, em com alguma razão, estão apavorados com a interpretação que os dois primeiros darão em relação aos atos da autoridade policial, ou seja, que ninguém confia na atuação de ninguém .
E nisso parece que todos estão certos. O nosso sistema de justiça – Judiciário, MP e Polícias – é uma latrina.
Entupida pelo mau-caratismo dos seus principais atores.
Consignando-se que advogado não é fiscal da atuação funcional desses agentes públicos; eventual representação por abuso será necessariamente levada ao Poder Judiciário ou órgão correcional .
Verdadeiramente, a gritaria é de gente que sabe que não tem quaisquer compromissos com a correta cumprimento da lei.
Por que os “tipos penais abertos” e os conceitos ‘indeterminados e subjetivos’ são atentatórios ao princípio da legalidade e perigosos apenas quando é “o nosso que está na reta” ?
Por fim, policial que em sua tarefa rotineira tem medo de se identificar , temendo por sua vida e de seus familiares, deve procurar uma atividade mais compatível com a sua covardia ou desfaçatez.
PM atira em suspeito, socorre baleado e se nega a entregar arma à Polícia Civil
19/08/19 por Arthur Stabile
Delegada afirma que PMs em São Sebastião (SP) cometeram fraude processual, mas coronel da reserva discorda
PMs apresentaram ocorrência no batalhão e quase 10 horas depois na Polícia Civil | Foto: Reprodução/Google Street View
Dois policiais militares que se envolveram em uma suposta troca de tiros com suspeito interferiram na cena do crime antes de apresentar o caso à Polícia Civil de São Sebastião, litoral norte de São Paulo. A ação ocorreu às 14h40 do dia 13 de agosto, mas a dupla de policiais levou a ocorrência ao 1ºDP (Distrito Policial) da cidade apenas às 23h, quase 10 horas depois.
De acordo com o B.O. (Boletim de Ocorrência), o soldado Fábio José Tonda e o tenente Rodolfo de Oliveira Quirino viram um homem com uma sacola na mão ao rondarem a Travessa Onofre Santos e suspeitaram que ele traficava drogas. Segundo a dupla, o homem resistiu à abordagem, derrubou o tenente em “luta corporal” e tentou pegar sua arma, o que fez Quirino atirar. O homem, Adonai Bispo dos Santos, 19 anos, foi baleado no tórax.
Os PMs ainda explicam que acionaram o Samu para socorrer o homem, mas a ambulância estava “em outro atendimento e a própria equipe policial realizou o socorro”, ato contrário às normas da SSP (Secretaria da Segurança Pública) de SP (leia aqui a Resolução nº 5, de 7 de janeiro de 2013). Os dois o levaram ao pronto socorro da cidade e dizem ter encontrado dois celulares, três colares, R$ 902, 42 pinos com “substância aparentando ser cocaína” e 15 trouxinhas “aparentemente de crack” com o suspeito.
No entanto, em vez de os PMs acionarem a Polícia Civil, corporação responsável por investigações criminais, os policiais decidiram acionar diretamente a perícia da Polícia Científica, conforme destacado no B.O. pelo delegado Carlos Eduardo Nascimento. Após prestarem socorro e solicitarem a presença da perícia, Tonda e Quirino voltaram para o seu batalhão e apenas às 23h apresentaram a ocorrência para o delegado.
Segundo Nascimento, ele requisitou a apreensão da arma do tenente Quirino, mas não foi atendido pois o policial entregou sua arma calibre .40 no batalhão para seu superior, identificado no documento como “Aquino”, que disse ter, de fato, apreendido o armamento. “Disse ainda o PM Aquino que somente estava apresentando a ocorrência relativa ao tráfico de drogas e que o disparo de arma de fogo não seria apresentado, pois era seu entendimento”, explica o delegado.
Carlos Eduardo então questionou o perito acionado o motivo dele ter ido ao local do suposto tiroteio sem o aval da Polícia Civil. Após explicar que existe uma norma que autoriza tal ação, o perito explicou que, na ocorrência, “não foram informados pelos Policiais Militares que o acionaram de que se tratava de disparo de arma de fogo contra civil, mas sim de lesão corporal em PM”.
Segundo a presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, Raquel Kobashi Gallinati, PMs que se envolvem em ocorrência com troca de tiros “obrigatoriamente devem apresentá-la ao delegado de polícia e ele que deliberasse as providências a serem tomadas, inclusive solicitação de perícia”. Para ela, neste caso “houve, no mínimo, fraude processual”
“Há a necessidade legal, processual, que crimes sejam apresentados ao delegado. Poderia até ser situação de um flagrante delito, não sabemos o que ocorreu, até porque houve alteração das provas e da cena dos fatos e uma desobediência. A ordem legalmente dada pelo delegado não foi cumprida”, analisa, criticando também o fato da dupla ter socorrido o homem, alterando a cena do crime, caso ele venha a falecer. “Deve ser verificado. Será que realmente foi resistência? Não sabemos”, complementa.
Gallinati argumenta que os crimes cometidos pelas polícias contra a vida de civis são julgados pelo Tribunal de Justiça comum, e não a Justiça Militar, o que impossibilita que militares investiguem estes casos. “Temos ainda a usurpação de função pública, prevaricação. O que espanta são os peritos, que são policiais civis, terem atendido uma requisição dos patrulheiros. A função da PM é patrulhamento ostensivo, de forma alguma é investigar. Em lugar algum está escrito que PM pode investigar crimes” explica.
O entendimento é diferente do que tem o ex-secretário nacional de segurança e coronel reformado da PM paulista, José Vicente da Silva Filho. Segundo ele, o crime cometido pelos policiais deveria ser apresentado no batalhão e não na delegacia. “A troca de tiros, se feriu uma pessoa, é um crime militar e, como militar, é apurado pelo Código de Processo Penal Militar. Isso obriga que o chefe do PM tome as providências. Se é um crime comum, é atribuição do delegado. Essa autoridade militar é irrenunciável na hipótese de crime militar, se é o caso de morte, aí é na Justiça comum”, justifica Vicente.
O coronel reformado explica que “cansou de fazer portaria para abrir inquéritos” quando comandava batalhões. “Às vezes as pessoas estranham. O comandante tem atribuição de policial judiciária militar. Todo comandante de unidade tem essa incumbência também para crimes especificamente militares, não pode simplesmente levar para a delegacia, estaria descumprindo uma norma legal”, emenda, dizendo que existem casos que demoram 20, 40 horas quando há crime em flagrante, quando questionado sobre a demora de quase 10 horas entre a troca de tiros e a ida dos PMs à delegacia.
Para ele, os PMs do caso de São Sebastião agiram corretamente também quanto ao socorro do homem baleado. “A única justificativa é na impossibilidade ou demora da equipe do Samu ou do resgate de bombeiro. Eventualmente o centro de operações da PM informou que não haveria veiculo de remoção hospitalar de emergência e teriam que fazer por meios próprios”, afirma. “Isso tudo é verificado. Em caso de periclitação de vida, o PM tem que resgatar, senão pode ser acusado de omissão de socorro”, finaliza.
A Ponte tentou contato com a delegacia de São Sebastião e o batalhão local da PM, mas os policiais solicitaram que a reportagem falasse oficialmente com a SSP SSP (Secretaria da Segurança Pública de São Paulo). Segundo a pasta, comandada pelo general João Camilo Pires de Campos neste governo de João Doria (PSDB), “todos os fatos relativos ao caso são apurados pelo 1º DP de São Sebastião e pela Polícia Militar, que instaurou um inquérito policial militar (IPM). As armas envolvidas na ocorrência foram encaminhadas à perícia”, diz nota enviada pela assessoria de imprensa terceirizada, InPress, à reportagem.
A reportagem também solicitou à Secretaria de Saúde do município de São Sebastião, chefiada pelo secretário Wilmar Ribeiro do Prado no governo do prefeito Felipe Augusto (PSDB), detalhes da situação do homem baleado. No entanto, a pasta não explicou se Adonai Bispo dos Santos recebeu alta, se continua internado ou se morreu.