João Vicente, o Dr. Liberatori está vivo , advogando, lúcido aos 86 anos, escritório em Pinheiros.
Segunda-feira, 14 de abril. São Paulo, 17 horas – Sem uma palavra e com uma chuva de balas 38 e 44, seis homens, com dois Volks, atacam uma Kombi do Banco Francês e Italiano, matam o guarda com oito tiros, ferem o motorista com quatro, dominam um funcionário a murros e pontapés e levam 20.000 cruzeiros novos. Tempo da operação: cinco minutos.
Terça-feira, 15 de abril. São Paulo, 11 horas e 30 minutos- Dois rapazes invadem uma oficina de alta costura, um deles com uma pistola automática. Há pânico. E tiros. Diante de uma espantada noiva a provar seu vestido, cai morta Dona Elizabeth, a proprietária do ateliê. Algumas horas depois, surpreendido ao assaltar um salão de cabeleireiro, o matador enfrenta um policial a bala. Acaba ferido e dominado.
Rio de Janeiro, meio dia – Dois rapazes, armados de revólver, entram numa loja no centro da cidade e, de possíveis fregueses, se transformam em assaltantes. Levam apenas 100 cruzeiros novos. Treze horas – Manuel Dutra, um açougueiro de 29 anos, única testemunha do assalto a uma agência do Banco Andrade Arnaud há um mês, é morto a tiros no seu açougue.
Quarta-feira, 16 de, abril. São Paulo, 15 horas – A prisão de Claudinho, um garoto de catorze anos, vem esclarecer uma série de crimes que vão do roubo ao assassinato, entremeados com vários atentados a bala. Uma das últimas proezas do grupo: assalto a um casal de noivos. O noivo tentou reagir e foi morto por Jailan, um bandido de quinze anos.
Belo Horizonte, 16 horas – Quatro homens vestindo fardas da Polícia Militar – um até fantasiado de tenente – esperam o carro pagador da mina de Morro Velho na estrada Raposos-Nova Lima. Um mineiro, suspeitoso com as perguntas que lhe foram feitas pelos “soldados”, alerta o pessoal, do carro pagador. E o carro, com os 160.000 cruzeiros novos, não sai nesse dia. A polícia procura até hoje os assaltantes fardados.
São Paulo, 17 horas. Em Jundiaí, Nelson Batista da Luz enfrenta a polícia com uma verdadeira fuzilaria, rompe o cerco e foge deixando sua carga preciosa: 194.000 cruzeiros novos de maconha.
Quinta-feira, 17 de abril. Porto Alegre. 15 horas e 30 minutos – Cinco homens, conduzidos por um muito parecido com Jack Palance, dominam quinze funcionários e dezoito clientes numa agência do Banco do Estado do Rio Grande do Sul, prendem todo mundo nos banheiros do subsolo, descem ao porão, entram no cofre e levam 84.000 cruzeiros novos. É o maior assalto da história do Rio Grande. “Jack Palance” e seus companheiros, todos com armas automáticas, gastaram no assalto cinco minutos.
Sexta-feira, 18 de abril. Rio de Janeiro – Um policial diz, brincando: “Bom mesmo é sábado e domingo”.
Sábado e domingo passam a ser o intervalo entre a violenta semana que termina e a que começa e promete. Isto já vale, desde o ano passado, para o Rio e São Paulo. E começa a valer também para Minas, Rio Grande do Sul, Estado do Rio, Paraná e Goiás. Este é o mapa da violência, dos assaltos a banco, da mão armada, da audácia e do crime organizado. De um crime que ganha em eficiência, técnica e brutalidade, faz adeptos entre meninos e engorda com entorpecentes. Há um novo crime na praça: mais ambicioso e mais duro. E um novo criminoso, que trocou a cachaça pela maconha, a faca pelo revólver e o pé-de-cabra pela sutileza: abre portas retirando o cilindro das fechaduras; antes arrancava as portas. E para enfrentar essa situação? Praticamente. a mesma polícia de sempre.
POLÍCIA NA ESCADA – Em todo o Brasil, hoje, a polícia é a mesma de ontem. Ou quase. No Rio, os policiais dizem que correm atrás de bandidos pela escada, enquanto os criminosos usam elevador. As 37 delegacias distritais com telefones sem linha, teletipos enguiçados e velhos arquivos não dão conta do seu recado. Um policial veterano, avaliando seus companheiros, salva 30% de bons, aponta 40% sem tarimba e sem entender nada de polícia e acusa os restantes 30% de ausentes por não quererem trabalhar. No Governo Goulart, 70% dos policiais optaram pela Polícia Federal e a Polícia da Guanabara substituiu-os por ex-condutores de bonde, ex-funcionáríos da Panair, etc. “E o nosso ordenado é uma piada”, diz um antigo policial. “Os bandidos estão aí de cabeça fresca. E a gente preocupado com a conta do armazém.” Já a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo declarou em nota oficial: “É fato notório que o serviço policial não acompanhou o progresso e o desenvolvimento do nosso Estado”. E esta confissão vale para todo o País, onde a falta de pessoal habilitado, a carência de aparelhamento e a pobreza dos vencimentos fazem polícias pouco eficientes, incapazes de ir além da rotina: diante de um assalto, correm aos velhos fichários onde selecionam os ladrões conhecidos que funcionam na área, e apresentam pilhas de fotos às testemunhas. Um arrastado trabalho que quase sempre não leva a lugar algum. Só no Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) há mais de 100.000 fichas. E se o assaltante procurado for uma cara nova no crime, a polícia se perde entre as várias e contraditórias descrições de um único bandido. Mesmo conhecendo o caso ocorrido nos Estados Unidos, em que cinco funcionários de um banco assaltado, impedidos de se comunicar entre si logo após o roubo, escreveram completas descrições do ladrão solitário: deram-lhe de vinte a quarenta anos, de 1,60 m a 1,90 m de altura, vestiram-no com branco, azul e amarelo, indicaram-no corno loiro, moreno e ruivo. Concordaram, os cinco funcionários, apenas em três pontos: o assaltante era branco, carregava um saco de papel em uma das mãos e um revólver na outra. “Uma polícia mais bem preparada, reaparelhada e bem paga” – é o sonho do Professor Hely Lopes Meireles, Secretário da Segurança de São Paulo. E de todos os outros secretários.
Enquanto isso, 1969 promete ser um ano tão ou mais violento que 1968. Porque mesmo uma polícia eficiente não vence o crime. Apenas o segura. “Chicago é a um só tempo a mais violenta e a mais bem policiada cidade americana: três minutos após um crime chegam três carros de polícia; porém, três minutos depois há outro crime”, diz o sociólogo Ruy Coelho. Talvez haja aí um pouco de exagero. Mas só um pouco. Claude Julien, especialista francês em criminologia, aponta algumas causas do aumento de criminalidade nos Estados Unidos: “A miséria de certas camadas da população, os problemas psicológicos de numerosos indivíduos submetidos a fortes tensões sociais, a deficiência da educação e a busca do lucro fácil”. Isto vale para o Brasil?
MUNDO VIOLENTO – Ruy Coelho acha que sim. E traz mais um dado: “A própria transição da agricultura para a indústria acelera o índice de criminalidade, com a corrida para a cidade grande que estimula o crime até com o anonimato, a sensação de fazer o que quiser já que ninguém vai ficar sabendo”. Nas regiões rurais, especialmente no Nordeste, os crimes mais freqüentes sempre foram e ainda são os crimes contra a pessoa, com maioria para os chamados crimes de honra. Nos grandes centros urbanos, entretanto, ganham os crimes contra a propriedade. E o que leva a isso é uma mistura de pobreza material com indigência cultural. E a transição da agricultura para uma crescente industrialização tem a ver com tudo isso: quando estruturas existentes são construídas, ou mudam rápidamente, sem que as novas estejam bem fixadas, sopra um vento favorável ao crime. Para o delegado Vidal Pilar Fernandes, 43 anos de idade e 22 de polícia em São Paulo, explicar a violência é ainda mais fácil que explicar o crime. “Pois não vivemos em um mundo violento? Quando eu era garoto, brincava com pião, papagaio, bola de meia. E a garotada de hoje? Não está aí correndo de carro, kart, motocicleta?” Vidal Fernandes acredita que “a violência do mundo chegou de vez ao crime” e que isso aconteceu e se generalizou “com a divulgação do poder do revólver”. E lembra o Luz Vermelha, um bandido que fez fama em 1967, em São Paulo, e que lhe confessou: “Quando fui fazer o neu primeiro assalto, o dono da casa me surpreendeu. Não gostei. Puxei a arma e o dominei”. É o delegado quem conta: “Aí, Luz sentiu, pela primeira vez, o poder de uma arma na mão. E, por isso, nos assaltos seguintes, fez questão de surpreender em vez de ser surpreendido: acordava as vítimas, com uma lanterna vermelha e um revólver ameaçador”. Luz era o tipo do bandido difícil de cair nas mãos da polícia: agia sozinho, não era conhecido, não tomava entorpecentes e chegou a detalhes como o de agir em São Paulo e morar em Santos. Entretanto, Luz é exceção. Diz Vidal Fernandes: “O crime é como o futebol: existem milhares de jogadores, mas apenas meia dúzia de grandes craques”. E, geralmente, os mais perigosos atuam em grupos de cinco ou seis. “Então”, diz o delegado, “a violência se acentua por emulação ou, simplesmente, para assegurar lideranças.”
A comparação entre as estatísticas de 1967 e 1968 da Divisão de Crimes Contra o Patrimônio, de São Paulo, traz revelações: o número de inquéritos para estelionato – contos do vigário e golpes sem emprego de força – caiu de mil para quinhentos; enquanto isso, o furto qualificado ou não – arrombamento de residência é considerado furto qualificado – subiu de mil para 1.700; e o roubo – assalto a mão armada inclusive – pulou de 150 para quatrocentos. E é bom notar que as vítimas de assalto a mão armada são as que em maior número deixam de procurar a polícia, temendo represálias por parte dos assaltantes. O quadro de homicídios também é significativo. Enquanto os homicídios culposos (em que o agente não tinha a intenção de matar, e matou por imprudência, negligência ou imperícia) caíram de 560 para 510, os homicídios dolosos (inclusive latrocínios) subiram de 280 para 350. E só não subiram mais porque, na hora do “a bolsa ou a vida”, o assaltado, cada vez mais, entrega a bolsa sem resistência.
GREGOS PIONEIROS – Em São Paulo, 1965, houve um único assalto a banco: o dos gregos que levaram 500 milhões antigos de uma.camioneta do Banco Moreira Salles, ao meio dia, no centro da cidade, com muitos tiros e a morte de um funcionário do Banco. Só a prisão da quadrilha, um mês depois, tirou a notícia das manchetes. No ano seguinte, ainda um único assalto. Porém, em 1967, o número pulou para oito. E no ano passado chegou a 37. Este ano começa pior: nos três primeiros meses, nove assaltos a banco, contra três no primeiro trimestre de 1968. No Rio, seis assaltos a banco em 1968. E quatro até abril de 1969. Só em São Paulo, desde novembro de 1967, o total roubado apenas em bancos e carros que levavam dinheiro já passa de 1 milhão de cruzeiros novos. A soma roubada nos outros Estados vai chegando, também, a essa cifra.
No Rio, 75% dos assaltos em geral ocorrem na Zona Norte, 80% dos furtos de carteiras e bolsas são feitos no Centro e 60% dos furtos em residências ocorrem na Zona Sul. Essa geografia do crime tem feição própria, em cada cidade e se caracteriza especialmente nas áreas de deterioração: zonas residenciais que se afastam e dão lugar ao comércio e à casa de cômodos; zonas comerciais em declínio; e as divisas de zonas residenciais e comerciais. É o caso dos Campos Elíseos e Barra Funda, em São Paulo. E da Lapa, no Rio.
Rubens Liberatori, 43 anos, dezessete de polícia, um dos delegados mais conhecidos e eficientes de São Paulo, atualmente na chefia da Zona Sul, que abrange as delegacias dos jardins ricos, bairros de classe média como Vila Mariana e periféricos como Parelheiros, tem clara noção dessa geografia do crime. “Um telefonema de um bairro rico pode ser uma simples briga de empregadas. O telefonema dirá. Mas é preciso estar atento às franjas da cidade, onde mora gente pobre e honesta que não dispõe de telefone para pedir socorro e cuja humildade esconde dramas com o silêncio. É preciso colocar viaturas nessas áreas. E policiais capazes de ajudar essa gente.” Liberatori não se engana com a polícia: “Vivemos num pais onde as mães dizem aos filhos: toma a sopa ou eu chamo o soldado”. Ele sabe que “polícia é serviço e deve ser bom e acessível”. Costuma cair sobre os bairros em que o número de assaltos aumenta com um rolo compressor: três carros, doze homens, milhares de quilômetros rodados, uma limpeza. Ele vem de uma família de médicos. Dizem que é por isso que ataca o crime como doença. Há vinte anos, ou até há dez, em geral, quando um grupo de policiais cercava o esconderijo de um ou mais bandidos, ao grito de “é a polícia”, a porta se abria e os criminosos se entregavam, mãos ao alto. Um investigador, ferido com um tiro recente na perna, garante que a coisa mudou. “A gente cerca, mas – se grita – eles abrem e mandam bala.”
Essa coragem nova tem calibre grosso. Há dez anos, um revólver 32 na mão de um bandido era uma novidade. Hoje eles não se contentam com menos de 38. E gostam muito de armas 44 e 45, de uso do Exército. De onde sai tanta arma? Roubadas de porta-luvas de automóveis; tomadas a bisonhos guardas-noturnos; furtadas em residências particulares; compradas no comércio ilegal ou – as comuns – até mesmo adquiridas em suaves prestações mensais, numa casa de respeito, por preço inferior a um bom par de sapatos. E as armas exclusivas do Exército e polícias militares, as metralhadoras, por exemplo? As nacionais são roubadas nas corporações. E as estrangeiras vêm pelos caminhos do contrabando.
A coisa chega a tal ponto, que um dos grupos assaltantes usa rajadas de metralhadora para intimidar e se comunicar… Mário Perez Fernandes, 52 anos, diretor do Deic, São Paulo, não acredita em surto de violência: “Tanto a Polícia Civil como a Guarda Civil e a Força Pública têm galerias de heróis. Todos morreram no cumprimento do dever. Violência não é novidade”. Para ele, “a tendência do crime é ir-se aperfeiçoando na medida da polícia”. Se a polícia tem um carro que corre a 120, os bandidos escolhem para a fuga um carro mais possante. Mas há assaltos que dão o que pensar. Como este: São Paulo, outubro, 1968 – Na Rua Nazaré Paulista, em Pinheiros, bairro de médio para rico, um homem veste a farda azul da Guarda Civil, capa de chuva e capacete branco. Parece um policial em serviço. Na esquina próxima, outro homem, este com ar de empregado da Prefeitura, instala e vigia um cavalete que interrompe o trânsito. Sentados, na calçada, mais dois homens. Um Fissore branco da firma Massey-Ferguson entra na Rua Nazaré Paulista, com 80.000 cruzeiros novos, pagamento dos empregados da empresa. O “guarda-civil” apita e ergue os braços. O Fissore para. O “guarda-civil” saca o revólver, o “empregado” da Prefeitura aparece com uma metralhadora, os dois que descansavam na calçada chegam com pistolas. O grupo inocente vira quadrilha, põe os funcionários da Massey-Ferguson em fuga e desaparecem usando o Fissore branco. Nota: para facilitar o sumiço, os assaltantes distribuíram mais alguns cavaletes pelas imediações, dificultando uma possível perseguição.
O USO DA CABEÇA – É evidente que a onda de assaltos a bancos e carros pagadores, quase todos sem solução, sugere que o crime começou a trabalhar com a cabeça. O Secretário Hely Lopes Meireles atribui o massacre à Kombi do Banco Francês e Italiano a um grupo subversivo. Porém, é claro que nem todos esses assaltos partem de fanáticos políticos. E nem o Secretário afirmou isso. O que há, segundo a maioria dos policiais, é uma maré enchente do crime comum aproveitando as águas dos criminosos políticos. E a própria qualidade desses assaltos traz exigências: bons carros (sempre roubados) para a fuga, armas automáticas e longas, pequenos rádios transmissores e receptores, cronometragem e outras filigranas.
No crime leve também há progressos: um batedor de carteiras inventou um aparelho capaz de substituir os dedos com vantagem. Foi preso na estréia, mas, como todo bom inventor, deixou-se emocionar pela “inauguração”. Na polícia acabou provando que o seu invento é eficiente; outro ladrão utilizava um aspirador de pó para sugar arroz, feijão, farinha e açúcar de um armazém. Introduzia o tubo pela vidraça e transferia os produtos com êxito, até ser pilhado pelo proprietário; e é indispensável lembrar os empregados de uma empresa de ônibus de Belo Horizonte que introduziam besouros em caixas de coleta de fichas. Os bichos desciam amarrados por barbante e voltavam, invariavelmente, abraçados a fichas que eram recolocadas em uso para um faturamento suplementar.
Agora, com a simples posse de entorpecentes transformada em crime passível de prisão de três a cinco anos, a polícia ganha força para enfrentar a maconha, as bolinhas, as ampolas de psicotrópicos e a cara cocaína (1 grama a NCr$ 50). E os crimes nesse setor vão pular para as cabeças das estatísticas. Só em São Paulo, no ano passado, foram apreendidos 6 quilos de cocaína (valor de cerca de NCr$ 300.000), 9.000 ampolas de psicotrópicos, mais de 100.000 bolinhas e perto de 100.000 quilos de maconha. E o entorpecente anda junto com o banditismo. Mais da metade dos crimes contra a pessoa cometidos em Nova York foram por pessoas que usavam entorpecentes. Quase 90% dos bandidos, em São Paulo e no Rio, agem estimulados pela maconha.
O CARRO, UMA ARMA – Um detetive carioca assegura que os bandidos, hoje em dia, estão motorizados. No Rio roubam-se, em média, seis carros por dia; em Belo Horizonte, quatro; e, em todo o Estado de São Paulo, sessenta. E o próprio furto de automóveis se transfigura: do puxador que abre o carro e parte com ligação direta em um minuto, chega-se, atualmente, ao bandido com revólver que põe o motorista para correr e sai tranqüilamente com o veículo. A lei, ao não enquadrar o furto de uso – toma ali, dá um passeio, deixa lá – abre um buraco no setor. E os menores? Com catorze anos, ou até menos, já há bandidos perigosos, hábeis motoristas (aprendem manobrando em pontos de estacionamento, lavagem), quase sempre bem armados (gostam de roubar arma de guarda-noturno), matam, roubam e, quando detidos, caem nos institutos de menores de onde quase sempre conseguem fugir. Eles sabem que a idade lhes assegura a impunidade. Existindo ou não, o certo é que o Esquadrão da Morte de São Paulo já completou seu 44º presunto (nome que se dá às suas vítimas). O do Rio, mais antigo, já passou de duzentos. Seus integrantes garantem que com a justiça sumária e drástica diminuíram o número de assaltos. Pode ser verdade para algumas regiões. Mas, paralelamente à marcha batida do Esquadrão, o crime se aprimorou em qualidade. E enquanto os misteriosos relações-públicas dos esquadrões carioca e paulista (apelidados de Rosa Vermelha e Lírio Branco) telefonam para as redações dos jornais com os endereços de novos “presuntos”, quase sempre bandidos do segundo time, os titulares estão matando e roubando no centro das grandes cidades.
Outra constatação: o grande bandido, tipo Luz Vermelha, de São Paulo, ou Mineirinho e Cara-de-Cavalo, do Rio, que sozinhos desafiavam a polícia com a astúcia ou com a pontaria (Mineirínho, certa vez, algemado, simulou um duelo a bala com o detetive Perpétuo: ganhou Mineirinho; Cara-de-Cavalo matou o inspetor Le Cocq, crime que acabou por criar o Esquadrão da Morte), está dando lugar a um novo bandido, que funciona em equipe, capaz de escolher o melhor profissional disponível para urna empreitada em vez de dar o lugar a um parente ou amigo, ou a um cachaceiro qualquer cuja inexperiência ou língua solta ponha tudo a perder.
QUAL É O REMÉDIO? – Entre a polícia de hoje e um filme de James Bond pode estar o remédio para enfrentar o crime organizado. Alarmas ligados diretamente nas delegacias, circuitos de TV, máquinas fotográficas disfarçadas, portas que se fecham automaticamente e até gases imobilizantes podem deter ou revelar quadrilhas que agem em bancos. Um policial mais culto, mais humano e, sobretudo, preparado para a sua profissão terá sempre mais utilidade que um caminhão de soldados primários e inexperientes. Uma sociedade atenta para os seus problemas e disposta a resolvê-los até onde for possível pode atacar um índice de criminalidade com mais vigor que um batalhão inteiro, e com melhores resultados.
Edward Kennedy, um homem que tem pelo menos dois bons motivos para se preocupar com o controle do crime, afirma: “Nenhuma necessidade humana é mais básica do que a segurança pessoal. Nenhuma liberdade é mais instintiva que a liberdade do medo. Se não estamos seguros em nossas casas e nas nossas ruas, se estamos ameaçados – ou por um agente de um Estado policial ou por um único criminoso -, então não somos livres”.
http://veja.abril.com.br/arquivo_veja/capa_23041969.shtml