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17/06/11 – 00:00 > OPINIÃO
O pior cego é o que não quer ver
Campos Machado é presidente do PTB-SP e secretário-geral da Executiva Nacional do Partido
É consenso entre os que conhecem um mínimo da alma humana que o capim não cresce sob a porta dos poderosos, tantos são os que a cruzam para cobri-los de elogios, perfilados, em ininterrupta romaria. Da mesma forma, no âmbito das mais diversas atividades, especialmente da política, há os que justificam como estratégia o não-enfrentamento e o silêncio ante os desmandos de quem detém o poder, mesmo que seus atos sejam nitidamente danosos aos que nos cabe representar. – Felizmente, não me incluo entre estes, até porque, desde cedo, aprendi que é da omissão dos bons que se alimentam os que se julgam acima do bem e do mal, em seus delírios de poder. Estou me referindo à situação vivida pela Polícia Civil de São Paulo, por conta da atuação do secretário da Segurança Pública, Antônio Ferreira Pinto, que, talvez sem se dar conta, contribui para desmoralizar seus comandados e, como se um ditador fosse, impõe decisões absurdas, confiante de que sua ação nunca será julgada pela história.
De todos os equívocos que protagonizou, que não foram poucos, desde que foi empossado no cargo e se arvorou em dono da Segurança, o mais danoso de todos foi ter ferido, de morte, a Lei Orgânica da Polícia Civil, e apunhalado a história da corporação. E, tudo isso, através de um simples decreto, retirando do órgão o seu coração – a Corregedoria – e instalando-a em seu gabinete, em uma alteração inexplicável de sua subordinação, já que, historicamente, ela sempre esteve vinculada à Delegacia Geral de Polícia.
Decreto, esquece-se o senhor secretário, nunca pode se sobrepor a uma lei. Ao contrário, decreto apenas e tão-somente serve para regulamentar uma lei; não se pode modificá-la, mesmo que dela não se goste. O curioso é que o Secretário não agiu da mesma forma com a PM, de cuja corporação fez parte, o que, em última análise, só serve para acirrar mais os ânimos entre policiais civis e militares, fruto de uma rivalidade antiga que todos sabem existir. Mas o mais chocante é o seu argumento para justificar essa decisão.
Parecendo não se preocupar com a honra alheia, o secretário diz, aos quatro ventos, que com isso está “limpando a Polícia Civil e acabando de uma vez por todas com sua banda podre”. A afirmação beira a leviandade -o que seria a tal banda podre?-, já que coloca sob suspeição todos os integrantes de um órgão público que tantos serviços presta à população paulista. Diz o Secretário, por exemplo, que há mais de 800 delegados envolvidos em processos por corrupção; aliás, diga-se, não concluídos, o que é uma contabilidade falaciosa (há vários casos em que o acusado é o mesmo). Todos sabem que nem cinco por cento do total de delegados estão sendo processados e que, dentre os 800 processos, há vários que tratam de infrações menores, como não usar gravata em um plantão ou por acidentes das viaturas policiais.
Qualquer ação no sentido de moralizar o serviço público é bem-vinda, mas um secretário estadual não pode incorrer no equívoco da generalização. Na Polícia Civil paulista, os processos administrativos e disciplinares sempre foram realizados pela Comissão Processante Permanente e seus delegados, que, especificamente designados para essas missões, dedicavam-se integralmente ao serviço. E mais: eram notórias suas qualidades intelectuais, pessoais, e sobretudo morais, sendo raros os casos de suspeição levantados contra seus integrantes.
Ao comprar essa briga e conclamar a Assembleia Legislativa a derrubar o referido decreto, o que é uma obrigação moral de todos nós, não foram poucas as vezes em que ouvi conselhos para não assumir um confronto desse porte. Mas o faço consciente de que esse é o meu papel, avalizado pelo voto que me conferiram quase 215 mil paulistas; mais do que isso, porque não nasci para ser vassalo de ninguém: pelo contrário, só aprendi a me curvar à minha consciência.
Gostaria, no entanto, de deixar bem claro que não caminho pela estrada da leviandade. Não tenho dúvida de que Ferreira Pinto, oficial da Polícia Militar de origem e atualmente integrante do Ministério Público Estadual, uma entidade que orgulha o nosso estado, é um homem de bem. Não me deixo levar pelo confronto pessoal. Apenas sigo empunhando a bandeira de que a nossa Polícia Civil é uma das melhores do mundo e que não pode, e não deve, ser desmoralizada e humilhada por quem quer que seja.
Se terei êxito nessa empreitada, não sei. O importante é estar em paz com a minha consciência, para o que prefiro agir como o beija-flor, que, diante de um grande incêndio que havia na floresta, começou um incansável vai-e-vem a um riacho, onde apanhava um pouco de água no bico e a jogava ao fogo. Ver aquilo incomodou um grande leão, que pergunta ao beija-flor: “O que está pretendendo, amigo? Quer apagar um incêndio que nenhuma tempestade consegue apagar?” O beija-flor simplesmente responde: “Eu sei que não vou apagar este incêndio, senhor leão. Estou apenas fazendo a minha parte.”









