25/03/2012-09h26
AFONSO BENITES DE SÃO PAULO
“Não saímos daqui porque aqui a gente tem comida, dinheiro e drogas.” Essa foi a resposta do ex-cuidador de crianças e morador de rua Josué Carriel ao ser questionado por que vive ao lado do centro de convivência São Luís Gonzaga, no Jardim Paulista, zona oeste.
Há 15 anos ele vive sozinho nas ruas dos Jardins. Antes, quando não era viciado em crack, morava no interior de São Paulo, com a família.
“Tinha emprego e cuidava de duas crianças lindas. Só caí nessa vida por causa da droga. Já tentei voltar para casa, mas não consegui me adaptar de novo”, disse.
De manhã, Carriel e outras 119 pessoas tomam café e almoçam no centro de convivência da avenida Rebouças, na zona oeste de São Paulo
À tarde, ele percorre as ruas em busca de latinhas de alumínio para revender para empresas de reciclagem e pede dinheiro para pedestres que passam pelos Jardins.
“Falo que o dinheiro é para comer, mas na verdade é para comprar droga e pinga”, diz.
| Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
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| Usuários de crack com a droga abaixo de viaduto que passa pela av. Rebouças, na zona oeste de SP |
BOCA DE FUMO
Nos intervalos entre o trabalho e a mendicância, fuma até dez pedras de crack. Todas compradas ali perto, no túnel entre a rua da Consolação e a avenida Rebouças ou na passarela de pedestres do Hospital das Clínicas.
Nas últimas três semanas, a Folha flagrou a venda e o consumo de drogas no túnel no início da manhã. Lá, assim como na cracolândia da Luz, na região central, a pedra custa R$ 10.
“Não sei o que acontece com a polícia que não consegue interromper o tráfico aqui”, reclama o educador Sérgio De Rose, dono de uma escola vizinha ao centro de convivência para os moradores de rua.
O delegado Ricardo Cestari, titular do 14º DP (Pinheiros), afirma que ao menos duas vezes por mês a polícia prende traficantes na região.
“Nós sabemos da existência desse ponto de tráfico de drogas. Estamos agindo, mas um traficante que foi preso hoje é rapidamente substituído por outro amanhã”, disse o policial.
25/03/2012–09h23
Concentração de morador de rua ‘assusta’ vizinhança dos Jardins
AFONSO BENITES DE SÃO PAULO
Iluminado pela fraca luz de um poste, um morador de rua lê o livro de autoajuda “A Grande Esperança”, de Ellen White.
São quase 5h de quinta e o auxiliar de pintor Gerson de Oliveira, viciado em leitura, está no fim da fila para entrar no centro de convivência São Luís, na avenida Rebouças, no Jardim Paulista, zona oeste de São Paulo.
Na frente dele, há quase cem moradores de rua e viciados em crack esperando a abertura do local, às 7h30, para poderem tomar banho, comer o café da manhã e, mais tarde, almoçar.
Administrado pela prefeitura e por uma ONG vinculada ao Colégio São Luís, o espaço, que atende a 120 pessoas em situação de risco por dia, existe no mesmo local desde 1997.
Moradores e comerciantes dos Jardins, porém, estão incomodados com o espaço e querem fechá-lo.
“Piorou nos últimos anos. À noite tem viciados que tentam roubar nossos clientes”, diz o educador Sérgio De Rose, dono de uma escola vizinha ao espaço.
Outra reclamação é que todos os dias, por volta das 23h, os moradores de rua começam a se aglomerar fazendo barulho. Para amenizar a algazarra, ao menos dois guardas-civis passaram a acompanhar a abertura do centro.
O possível fechamento da casa foi um dos assuntos mais comentados nas últimas reuniões do Conseg (Conselho Comunitário de Segurança) dos Jardins. A presidente do órgão, a advogada Maria Tereza Cabral, diz que já pediu para a prefeitura mudar os moradores de local, mas a resposta foi negativa.
“A prefeitura não encontrou outro imóvel para abrigar o pessoal”, disse Cabral.
Segundo a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social, a busca já dura dois anos. Em nota, o órgão informou que procura um imóvel para se mudar, naquela mesma região.
| Eduardo Anizelli/Folhapress | ||
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| Moradores de rua aguardam para tomar o cafe da manhã em ONG nos Jardins (SP) |
JOIO DO TRIGO
Quatro frequentadores do local ouvidos pela Folha dizem que não é possível dizer que todos que lá estão são “bandidos”. “Sofremos preconceito porque vivemos na rua. Só cato latinha e peço dinheiro”, afirmou o desempregado Jonas Rodrigues.
Também há comerciantes que são contrários ao fechamento do local. “É uma ignorância fechar esse lugar. As pessoas só querem varrer o problema para a varanda do vizinho. Se não ficarem aqui, vão para outro bairro e a reclamação vai continuar”, disse o gerente Rodolfo Ruas.
E se o centro fechar? “Aí minha esperança será o lixo desses prédios de rico. Só lá que vou achar comida”, afirmou Oliveira, aquele leitor de livros de autoajuda.

