APROVADO FIM DA LEI DA MORDAÇA EM SP
Assembléia derruba item que proíbe críticas à administração pública. Governador decide
FÁBIO MAZZITELLI, fabio.mazzitelli@grupoestado.com.br
A Assembléia Legislativa de São Paulo aprovou anteontem à noite, em votação simbólica, o fim de um item do Estatuto dos Funcionários Públicos do Estado que proíbe o servidor de se manifestar livremente em relação a gestores e atos da administração pública.
Apelidado pelos deputados de “lei da mordaça”, esse dispositivo legal data de 1968, ano do estatuto do funcionalismo estadual, e o projeto de lei complementar que o revoga, do deputado Roberto Felício(PT), foi aprovado em regime de urgência, após acordo entre as lideranças do Legislativo.
O projeto irá à apreciação do governador José Serra, que decidirá pela sanção ou veto, em 15 dias.
A restrição aos servidores estaduais consta no primeiro inciso do artigo 242 do estatuto do funcionalismo e proíbe referências depreciativas às autoridades e à administração pública “em informação, parecer, despacho ou pela imprensa”. A livre manifestação do pensamento é garantida pelo artigo 5º da Constituição.
“As autoridades que gerem os serviços públicos usam costumeiramente este artigo para intimidar os servidores”, afirmou o deputado Roberto Felício, líder do PT, na justificativa do projeto.
A luta pelo fim da lei da mordaça no funcionalismo começou no ano passado, encampada pela Ação Educativa, ONG da área da educação que listou casos em que professores e diretores de escolas relatavam proibições e advertências administrativas com base no estatuto do funcionalismo ou, mesmo sem a proibição explícita, prática da autocensura.
“Ficou explícito que essa legislação era inconstitucional a partir de 1988 (com a promulgação da nova Constituição). Mas, como isso nunca foi colocado no papel, pairava sobre os servidores. Existia o medo e o uso desse medo por parte das autoridades”, diz a advogada Paula Martins, coordenadora do escritório brasileiro da ONG Artigo XIX, que apoiou a campanha “Fala, educador! Fala, educadora!”, da Ação Educativa.
A iniciativa ganhou eco dentro do próprio governo paulista. No último dia 3, em audiência pública na Assembléia, a secretária de Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, classificou o dispositivo de “absurdo” e “do tempo da ditadura”. Segundo a Secretaria Estadual de Educação, a secretária Maria Helena “aplaude” o fim do dispositivo.
A revogação da restrição vale para todos os setores do funcionalismo. A Secretaria de Gestão diz que, na atual gestão, nenhum processo administrativo foi aberto com base na lei da mordaça. A Casa Civil do Estado afirma que vai se manifestar dentro do prazo legal, de até 15 dias úteis.“Como o governador Serra se manifesta a favor da liberdade de expressão, como já fez várias vezes em relação à Lei de Imprensa, entrará em grande contradição se vetar o projeto”, diz o deputado Carlos Giannazi (PSOL), que apresentou proposta similar na Assembléia. Segundo levantamento da Ação Educativa, além de São Paulo, outros 17 estados brasileiros têm a “lei da mordaça” no funcionalismo, sendo que em nove o dispositivo é posterior à Constituição de 88.
Fonte: Jornal da Tarde, 12 de dezembro de 2008, pág. 11A