CNJ diz que 35 desembargadores são suspeitos de crimes 1

Destes, 20 já sofreram punições do conselho, que podem ser anuladas pelo STF

Acusações contra juízes
e ação que pode retirar poder de investigação do CNJ causam guerra na cúpula do
Judiciário

FLÁVIO FERREIRA

DE
SÃO PAULO

 

Ao menos 35 desembargadores são acusados
de cometer crimes e podem ser beneficiados caso o STF (Supremo Tribunal Federal)
decida restringir os poderes de investigação do CNJ (Conselho Nacional de
Justiça), órgão que fiscaliza o Judiciário.
Os desembargadores são juízes
responsáveis por analisar os recursos contra sentenças nos tribunais de Justiça.
Formam a cúpula do Judiciário nos Estados.
O Judiciário foi palco de uma
guerra esta semana após declaração da corregedora nacional de Justiça, Eliana
Calmon, de que o Poder sofre com a presença de “bandidos escondidos atrás da
toga”.
A corregedora tenta evitar que o Supremo restrinja a capacidade de
investigação do CNJ ao julgar uma ação proposta pela AMB (Associação dos
Magistrados do Brasil).
O caso seria analisado na sessão de ontem, mas os
ministros adiaram o julgamento para buscar uma saída que imponha limites ao CNJ
sem desgastar a imagem do Judiciário.
Dentre os 35 desembargadores acusados
de crimes, 20 já foram punidos pelo conselho -a maioria recorre ao STF para
reverter as punições. Os demais ainda respondem a processos no âmbito do
CNJ.
Dependendo do que decidirem os ministros do STF, os desembargadores
acusados poderão pedir em juízo a derrubada das punições e das investigações em
andamento.
Os casos envolvem suspeitas de venda de sentenças, favorecimento a
partes pelo atraso no trâmite de processos e desvios de recursos, entre outras
acusações.

INVESTIGADOS
Considerando também os juízes de
primeira instância, cerca de 115 investigados podem ser beneficiados caso a ação
da AMB seja vitoriosa.
A entidade defende a tese de que o CNJ não pode abrir
processos contra juízes sem que eles antes sejam investigados pelas
corregedorias de seus próprios tribunais.
O debate ocorre sob alta
temperatura e opõe Eliana Calmon e o presidente do STF, ministro Cezar Peluso
(que também preside o CNJ). Peluso reagiu duramente à declaração de Calmon,
coordenando a redação de uma nota de repúdio às frases da corregedora, que
considerou genéricas e injustas.
Ontem, o ministro Gilmar Mendes defendeu a
corregedora ao dizer que sua declaração foi motivada pelo resultado positivo do
trabalho da corregedoria do CNJ.
Mendes disse que vê com bons olhos a tensão
entre os órgãos do Judiciário. “Vamos fazer do limão uma limonada”, disse sobre
o debate.

MAÇONARIA
Um dos principais casos analisados pelo
CNJ envolve desembargadores do Mato Grosso, afastados pelo CNJ sob acusação de
desviar verba do Tribunal de Justiça local para socorrer uma instituição da
maçonaria. O processo está suspenso por meio de liminar. Os envolvidos negam as
acusações.

Ministros do STF buscam acordo para limitar ação do
CNJ

Supremo adia julgamento e discute critérios para conter
conselho sem esvaziar completamente suas funções

Ideia é definir
novos parâmetros para CNJ investigar casos de magistrados acusados de crimes nos
Estados

FELIPE SELIGMAN
DE
BRASÍLIA

Os ministros do STF (Supremo Tribunal
Federal) querem impor limites ao poder que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça)
tem atualmente para investigar juízes acusados de cometer crimes, mas buscam uma
maneira de fazer isso sem esvaziar completamente as funções do órgão.
Os
ministros decidiram ontem adiar o julgamento de uma ação da AMB (Associação dos
Magistrados Brasileiros) que tenta derrubar a resolução do conselho que
estabelece regras para investigar e punir magistrados sob suspeita. A AMB
considera a atuação do CNJ inconstitucional, por ferir a independência do Poder
Judiciário.
Em conversas reservadas, integrantes do tribunal concluíram nos
últimos dias que é possível encontrar uma solução consensual, que tenha o apoio
da maioria dos ministros e assim evite a repercussão negativa que uma decisão
radicalmente contrária à atuação do conselho teria.
A ideia é definir
parâmetros para indicar em que circunstâncias e de que maneira o CNJ poderia
entrar em ação. O voto em que o STF definiria essas questões já tem um esqueleto
pronto, mas falta acertar os detalhes.
Uma das propostas prevê que o
conselho, ao receber denúncia de irregularidades cometidas por um magistrado,
estabeleça um prazo de alguns dias para que a corregedoria do tribunal estadual
em que ele atue abra processo contra ele. Se isso não acontecer, o CNJ poderia
então investigar o caso.
Nos casos em que o tribunal abrir investigação sobre
o magistrado sob suspeita, o conselho poderia também estabelecer prazos para que
ela produza resultados. Quando isso não ocorrer, o CNJ assumiria o controle do
processo e passaria a investigar a própria corregedoria estadual.
Essas
ideias começaram a ser discutidas no início da semana passada. O ministro Luiz
Fux é quem está mais perto do voto considerado ideal pelos colegas. Ele só
deverá ser levado ao plenário do Supremo quando a maioria dos ministros
concordar com os critérios estabelecidos.

TEATRO
Mas nem todos
concordam em chegar a um acordo. O ministro Marco Aurélio Mello, historicamente
avesso a esse tipo de negociação a portas fechadas, é contra a ideia. “Não cabe
acerto prévio”, afirmou. “Nós compomos um tribunal, não um teatro”. Relator da
ação proposta pela AMB, ele deverá proferir o voto mais duro contrário à atuação
do conselho quando o julgamento for retomado.
Criado em 2005 para exercer o
controle externo do Poder Judiciário, o CNJ puniu até hoje 49 magistrados, entre
eles um ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Paulo Medina.

Atualmente, o conselho pode abrir procedimentos disciplinares mesmo nos
casos em que o tribunal estadual já investiga o magistrado sob suspeita.

Frase

“Não
cabe acerto prévio. […] Nós compomos um tribunal, não um teatro”

MARCO AURÉLIO MELLO
ministro
do Supremo Tribunal Federal

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