Elite de Aparências: ROTA e o Oficialato que Preferem Clareamento Dental a Saúde Mental

Comando que Não Enxerga: Da Psique Ignorada ao Sangue nas Ruas

Basta um olhar atento aos detalhes da recente reportagem do Metrópoles para que se perceba o real ponto de inflexão no caso do sargento Marcus Augusto Costa Mendes: a negligência sistemática em relação ao componente emocional dos policiais, mesmo no ambiente autoproclamado mais exigente da Polícia Militar –  a ROTA.

O afastamento de Marcus na esteira da morte do policial civil evidencia, sobretudo, o que sempre esteve subentendido nas políticas internas da corporação: a convicção de que basta disciplina e treinamento para tornar qualquer agente apto para o serviço policial  ignorando, por completo, os fatores psicossociais que potencializam riscos para todos.

Contudo ,  é fundamental sublinhar que esta abordagem não busca, em nenhum momento, realizar qualquer juízo de valor ou imputar responsabilidade a Marcus pelos atos do pai.

Repudiamos  qualquer leitura que derive de conceitos heredocráticos, moralistas ou vingativos, pois não cabe à análise científica, tampouco à crítica institucional responsável, pré-julgar indivíduos com base unicamente em laços familiares ou na biografia de ascendentes.

Contudo , cabe a indagação , um rapaz de 25 anos como o Sargento Marcus , diante do trauma de ter o pai preso por matar quem o repreendeu por estar praticando sexo com uma moça ( felação ) em lugar público, tem o necessário equilíbrio para trabalhar nas ruas , ainda mais num batalhão de combate violento como a ROTA ; que se diz destinada aos melhores.

Será que o comando jamais refletiu sobre tais aspectos e a  deletéria influência no dia a dia policial , ainda mais no caso de o Sargento acreditar que o pai foi vítima de “uma armação”  por parte dos criminosos?

E como conviver com o conflito interno : “combater o crime sendo filho de um criminoso condenado” ?  

O mais emblemático aqui não é apenas a tragédia familiar envolvendo pai e filho policiais, mas sim a omissão objetiva e continuada dos chamados  Oficiais do Alto Escalão , nos últimos anos egressos dos “setores ditos de elite” como a ROTA.

Omissão que se reflete por todo o aparato institucional, ainda que haja, formalmente, equipes de psiquiatria, psicologia e assistência social à disposição.

E os profissionais  abnegados se esforçando – sem o devido reconhecimento – para humanizar e aprimorar critérios de seleção, qualificação , saúde , redução de acidentes,  maior e melhor acompanhamento psiquiátrico e psicológico; sem estigmatização de quem adoece em razão do serviço.

Estigma  –  ser um 13 –  que é a maior causa de não se buscar ajuda especializada!

Estudos como os de Murray, Farrington e outros deixam claro: o trauma familiar público  –  notadamente quando um pai é preso e exposto pela própria corporação –  aumenta substancialmente as chances de sofrimento mental e de doenças emocionais em qualquer jovem, sobretudo em ambiente hostil e competitivo como o das tropas de elite.

O que aconteceu com Marcus teria ensejado –  em qualquer instituição não contaminada pelo corporativismo ou pela ânsia de autoproteção  – um escrutínio profundo sobre seu real preparo psíquico, independentemente de sua folha disciplinar.

Em vez disso, o comando da corporação optou por não enxergar o óbvio: a presença de um agente marcado por abalo familiar severo, bombardeado por estigma e pressão, em um ambiente onde a impulsividade é tão perigosa quanto a omissão.

A ROTA da Polícia Militar , frequentemente tratada como símbolo máximo de eficiência operacional, simplesmente nunca enxergou  – ou ignorou ou manipulou – o potencial explosivo contido na questão emocional.

Isso, por vezes, reflete arrogância do oficialato da PM diante de qualquer análise interdisciplinar,   como se uma formação militar bastasse para enfrentar temas de complexidade humana.  

E um erro caro: em concursos e seleções, candidatos são sumariamente excluídos por traumas identificados em entrevistas; porém, quando a lealdade interna fala mais alto, fecha-se os olhos para sinais de alerta gritantes se o policial já faz “parte do grupo”.

É preciso reconhecer, sem rodeios: ao ignorar as vulnerabilidades emocionais dos próprios agentes, a PM/SP transforma servidores em riscos ambulantes ; para si, para os colegas e para a coletividade.

E como consequência vivenciamos o traumático  homicídio do policial civil Rafael.

Deixou três crianças órfãs ; que ficarão desamparadas  paternal e financeiramente.

Tudo será feito pelos procuradores do estado para que seus direitos sejam reconhecidos em grau mínimo , caso não se possa negar na totalidade.  

O episódio do homicídio praticado por  Marcus Mendes  contra Rafael –  e com a tentativa de se livrar da responsabilidade deslocando-a para a vítima – é menos um retrato pessoal ou familiar, e mais a prova contundente de uma miopia institucional.  

O Oficialato da PM  –  composto por médicos , psicólogos , juristas , engenheiros,  administradores , etc.  –  Não tem o direito de falhar no mais básico: entender e intervir, com competência, sobre o que há de mais precioso e delicado nas  fileiras policiais –  a mente e as emoções de seus próprios integrantes.

E entre a arrogância e a incompetência , há alguns Comandantes  mais cuidadosos com suas lentes nos dentes e seus tratamentos estéticos na face sempre viçosa.

Enquanto investem em procedimentos estéticos e clareamentos dentários, não há verba para psiquiatras e psicólogos.  

Deveriam usar apenas óleo de peroba quando com desfaçatez ( cara-de-pau )  subestimam a nossa inteligência com as suas costumeiras –  falsas ou incompletas  – versões oficiais,  

Se preferirem a prioridade estética sobre vidas , então  que continuem cuidando muito mais das suas delicadas cútis  facial…

Mas que sejam envernizadas antes de  – publicamente – normalizarem  as ocorrências com assassinatos de inocentes!

Omissões e Desigualdade Também na Polícia Civil

A arrogância ,  a ignorância  e a omissão também são abundantes entre delegados da Polícia Civil.

O assassinato do policial civil Rafael Moura, ainda que tenha como vetor imediato as falhas gritantes da Polícia Militar, também revela graves omissões e fragilidades internas da Polícia Civil paulista.

Tais debilidades são, em grande parte, consequência da postura frequentemente omissa e subserviente de seus dirigentes –  em especial Delegados de Polícia de classe especial  –  incapazes de assegurar autonomia, voz crítica e condição digna de trabalho para seus agentes.

Soma-se a isso o notório esquecimento institucional e o desprezo histórico com que o governo estadual trata a Polícia Civil, quadro que se agravou sensivelmente sob a gestão de Tarcísio de Freitas, cuja política de segurança concentra esforços e recursos quase exclusivos na Polícia Militar, particularmente no atendimento aos privilégios do oficialato e de militares inativos.

Essa inversão de prioridades não apenas esfacela o serviço investigativo, mas encoraja dinâmicas corporativas perniciosas e a manutenção de velhos vícios administrativos.

Tamanha negligência do Poder Executivo exige, com urgência, a criação de auditorias independentes –  e, se necessário, uma CPI –  para apurar tanto a sistemática omissão governamental frente às demandas da Polícia Civil, quanto as reiteradas falhas disciplinares e episódios de violência protagonizados pela PM.

Os indícios são claros: se há tantas tragédias e abusos, é sintoma de que a saúde mental das tropas está severamente abalada — e isso, em última análise, reflete o desprezo do Estado pela segurança pública que deveria ser voltada, acima de tudo, ao cidadão.

Por fim , quando as exceções são inexistentes ou irrelevantes na prática, generalizar não é um crime,  mas o único recurso retórico válido para escancarar um padrão.