sab, 01/02/2014 – 18:32 – Atualizado em 02/02/2014 – 09:03
Um caso concreto para entender o problema dos presídios e do atendimento aos humildes.
Marluce é um doce de criatura. Ela e sua irmã Marlene. Os comentaristas mais antigos do Blog certamente se lembram das crônicas da Bibi, com seus 8 anos, falando da Marlene que conversava com passarinhos.
Marluce tem um filho de vinte e poucos anos. Na véspera do ano novo, pretendendo reatar com a namorada, pediu a moto do vizinho emprestada. Foi parado por uma inspeção que constatou que a moto era roubada.
Foi apenas uma inspeção. Não se tratou sequer de um flagrante. Chamado pela polícia, a vítima reconheceu a moto como sendo dele. E reconheceu também como dele o relógio que Marluce havia comprado com seu dinheirinho de doméstica.
E foi assim que o rapaz foi parar na Casa de Detenção, convivendo com bandidos de alta periculosidade.
Marluce fez uma romaria. Primeiro foi à delegacia, onde lhe informaram que deveria ir ao Forum. Chegando lá, foi informada de que, devido aos feriados de fim de ano, o fórum só reabriria dia 6. Não lhe deram sequer a informação que de havia plantão.
Neem se imagine que os sistemas de informaçao são falhos: quando se trata da cadeia improdutiva dos advogados de porta de cadeia, funcionam. Marluce nao recebeu nenhuma informação, mas apareceu em sua casa um advogado pedindo 6 mil reais para livrar o menino. Marluce não tinha.
Informada sobre seu drama, uma especialista, para quem ela trabalhou como diarista, orientou-a a procurar a Defensoria Pública. Foi até lá, informaram que tinha chance de ser liberado, porque
documentação em ordem, residência fixa e carteira de trabalho. Mas a defensora nao entrou com habeas corpus. Informou que só poderia pedir o HC na primeira audiência com o juiz, que levaria mais 90 dias.
Nos próximos dias, levantaremos o nome dos personagens, incluindo a defensora pública que, por acomodamento, deixa o menino correndo riscos na casa de detenção.
Detalhe: o rapaz era apenas pobre, não era preto. ( grifos nossos )
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Nassif, não se deixe levar pelo coração; especialmente pela expiação suportada pela mãe .
O rapaz foi surpreendido usando ( conduzindo em proveito próprio ) um veículo roubado , conduta que – no mínimo – corresponderia ao crime , previsto no art. 180 do Código Penal, de receptação:
Art. 180 – Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influi para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
Ora, sabendo-se que é dever de todo condutor portar a CNH e documento de licenciamento do veículo, tomar uma moto emprestada sem a correspondente documentação já é indício de má-fé , ou seja, que sabia da procedência criminosa.
Trazia consigo o CRLV ?
Não, né ; pra quê ?
Segundo os estudiosos , tal modalidade de receptação se prolonga no tempo ; sendo seu autor passível de prisão em flagrante a qualquer momento ou lugar onde venha ser surpreendido conduzindo o veículo furtado ou roubado.
Mas não fosse o bastante conduzir o veículo roubado , foi reconhecido como sendo o próprio assaltante.
Art. 157 – Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
Mais: e ainda trazia consigo o relógio subtraído da vítima.
Obviamente, a vítima, salvo o roubo tivesse acabado de ser executado , o que deixaria induvidosa a suspeita , naquele momento do reconhecimento, já devia ter providenciado o BO; nele registrando a subtração de seus bens; tudo devidamente descrito no respectivo boletim.
Ademais , não falsearia o reconhecimento pessoal do autor, do veículo e do relógio apenas para prejudicar um suspeito qualquer e, ainda , levar uma vantagem recebendo da Polícia Civil um objeto que não lhe pertence.
Com efeito, considera-se em flagrante delito nos termos do art. 301, IV, do Código de Processo Penal , quem “é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração” .
No caso , por objetos entenda-se o produto do crime: motocicleta e relógio
Consignando-se que a expressão “logo depois” não pode ser demasiadamente alargada pela autoridade policial sob pena de o Juiz decretar a inexistência do flagrante delito e consequentemente libertar o flagranciado.
Verdadeiramente, o indiciado está preso por haver vários indícios de ter cometido um crime muito grave: ROUBO!
Não por culpa da Polícia; tampouco da Defensoria.
Pela própria culpa!
E se os fatos se deram conforme o raciocínio acima , não cabe nenhum “habeas corpus” .
Por outro aspecto, a Dna. Marluce – para o filho de vinte e poucos anos não chegar atrasado ao trabalho – deve ter comprado , com seu dinheirinho de humilde doméstica, o relógio parceladamente ; assim com a apresentação do carnê e da nota fiscal , bem como fazendo a delação e identificação do vizinho que emprestou a moto roubada , o delegado ainda poderá fazer provas da inocência do rapaz e encaminhá-las prontamente ao Poder Judiciário.
Remate: milhares de pais e mães – por motivos compreensíveis e até perdoáveis – repetem a mesma história acima…
Entretanto, o vizinho que emprestou a moto , o amigo ou mesmo o providencial conhecido da balada nunca aparecem; as notas fiscais do tênis de R$ 999,99 , do celular , da jaqueta ou relógio ( iguaizinhos aos das vítimas ), idem!
Enfim , caro Nassif, podemos apostar que no caso em questão – ” o menino” – não se trata de um “apenas pobre” , trata-se de um “APENAS LADRÃO” .