Jogando dados com a morte, Coluna Carlos Brickmann 13

(*) Coluna exclusiva para a edição dos jornais de Quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O número de homicídios em São Paulo caiu drasticamente, informam as estatísticas oficiais. Isso quer dizer que há menos gente sendo assassinada? Não, não é bem assim: há mais mortos. Sempre de acordo com os números da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo, os homicídios dolosos (em que há intenção de matar) caíram 7% na Capital e 2,2% fora da Capital. Os homicídios culposos (em que não havia a intenção de matar) se reduziram em 2,05%.

Agora, o grande mistério: houve redução de homicídios dolosos, houve redução de homicídios culposos, mas o número de vítimas não diminuiu: ao contrário, aumentou. Era de 376, passou a 382. Se o número de vítimas aumentou e o de homicídios diminuiu, como fechar a conta? Vamos lá: seu salário foi reduzido, mas a quantidade de reais que você recebe aumentou. Qual a mágica?

Talvez haja alguma explicação (pode-se procurar na obra-prima O Homem que Calculava, de Malba Tahan – que além de expor e resolver problemas matemáticos é muito bem escrito). O interessante, entretanto, é que nossos grandes jornais de circulação nacional aceitaram a informação sem discuti-la, sem dar aos Homens que Calculam da Secretaria da Segurança Pública a oportunidade de explicá-la, sem dar a este colunista e a outros leigos a oportunidade de entendê-la.

Talvez a solução esteja numa famosa frase do economista americano Aaron Levenstein: “A estatística é como um biquíni. O que mostra é sugestivo, mas o que esconde é essencial”.

Aviões, submarinos? Não…

Um grande vazamento de diálogos pelo WikiLeaks, portal especializado em divulgar informações sigilosas, sugere que a compra de submarinos franceses pelo Brasil é muito estranha e pode estar relacionada a pagamentos ilegais. Sugere também que a possível compra dos caças supersônicos Rafale, também da França, será algo tão absurdo que pode levar a maus pensamentos.

Os vazamentos do WikiLeaks não levam necessariamente à verdade. E é curiosa a data do vazamento, próxima àquela em que, segundo corre em Brasília, seria anunciada a compra dos Rafale. As fontes cujas informações foram vazadas defendem os caças americanos Boeing F-18 – o vazamento, portanto, lhes é conveniente.

…é o estaleiro, estúpido

A história mais significativa do acordo militar entre Brasil e França não é a que aparece nos WikiLeaks: é a do estaleiro que o Brasil constrói, com tecnologia francesa. Por algum motivo, os franceses exigiram que o estaleiro fosse construído por uma empresa brasileira, e uma empresa específica: a Odebrecht.

Não é comum, em acordos internacionais, que um país indique as empresas do outro que devem ser escolhidas. E não é nem daqueles casos em que se determinam características que levarão à escolha de uma empresa: é aquela, só aquela e pronto.

Tico-tico no fubá

O candidato do PT à Prefeitura paulistana, Fernando Haddad, começou prometendo fazer dura oposição ao atual prefeito, Gilberto Kassab. Aí Kassab se aproximou do ídolo e mentor de Haddad, o ex-presidente Lula, e só faltou Haddad se lançar ao chão diante do prefeito, gritando “Caramuru! Caramuru!” Mas Kassab cumpriu sua velha promessa: se Serra fosse candidato, ele o apoiaria. E Haddad está hoje na oposição ao ex-quase-futuro-aliado – tão feroz que até já forjou uma frase oposicionista, “a volta dos que não foram”.

Está em plena campanha: anda despenteado (o que lhe deve doer na alma), com a camisa social finíssima fora das calças, vestindo-se como deve achar que um trabalhador se veste. Uma hora dessas é capaz de ousar até pegar ônibus ou metrô.

Veja só

O que uma eleição é capaz de fazer: a alta cúpula do PSDB, temendo a desagregação do partido em São Paulo, foi buscar José Serra para candidato. É a primeira vez que alguém pensa em Serra como elemento agregador.

A dança dos preços

A compra do carro é um investimento pesado, que exige que a família faça cálculos para rodar da maneira mais econômica possível. Qual o custo do seguro? O valor de revenda? Álcool, gasolina ou flex? Depende dos preços relativos dos combustíveis. E como estão esses preços no Brasil?

Depende da autoridade que fala: o ministro das Minas e Energia, Édison Lobão, a quem a Petrobras é subordinada, disse no dia 10 que o preço da gasolina não vai subir. A presidente da Petrobras, Graça Foster, unha e cutícula com a presidente Dilma, disse no dia 26 que é preciso corrigir, sim, o preço dos combustíveis. Quem ganha a parada?

Aqui e lá fora

O duque de Palma, Iñaki Urdangarin, marido da princesa Cristina e genro do popularíssimo rei Juan Carlos, foi interrogado por nove horas (e, no dia seguinte, o interrogatório prosseguiria). O duque é suspeito de desvio de recursos públicos, falsidade ideológica, fraude e prevaricação. A investigação começou em 29 de dezembro último e, dois meses depois, está a ponto de levar ao julgamento.

Alguma semelhança com o Mensalão? Por incrível que pareça, há uma: a frase que o duque mais disse, no interrogatório, foi “não me lembro”.

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