MEU GOVERNADOR É GRANDE CONSELHEIRO E ECONOMIZADOR 6

O conselho do governador
DAVI DE LACERDA
O pragmatismo do conselho que o governador me deu reflete o descaso do Estado com os médicos da rede pública de saúde
A SÃO Paulo Companhia de Dança realizou no dia 7 deste mês uma magnífica apresentação em comemoração ao seu primeiro ano de existência. Entre as várias autoridades presentes estava José Serra. Ele escreveu a introdução do programa e merece grandes elogios pelas realizações da companhia. O belo espetáculo foi seguido de um coquetel, no qual tive a honra de parabenizar o governador pessoalmente pela alta qualidade técnica alcançada por uma companhia tão jovem. O breve encontro foi a oportunidade de lhe comunicar um fato que me deixara perplexo, ocorrido no início daquela semana. Ao me apresentar, contei ao governador que sou médico, que fiz graduação na USP, pesquisas em Harvard, residência em dermatologia no hospital Johns Hopkins (EUA) e especialização em cirurgia dermatológica em Paris. Contei também que há cinco dias fora contratado como médico concursado do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Ele sorriu e me deu parabéns. Ao agradecê-los, muito constrangido, informei-o de meu espanto ao descobrir que o salário-base para o médico do HC era de R$ 414 mensais para uma carga horária de 20 horas semanais. O governador buscou me consolar dizendo que eu não ganharia só isso. Respondi que estava ciente das gratificações e que, mesmo assim, meu salário bruto seria de R$ 1.500.Informei-o ainda de que o custo para manter meu consultório fechado durante as horas em que estarei no HC é o triplo do valor que receberei do Estado. Àquela altura, quando já não mais sorríamos, pedi sua opinião. O governador me aconselhou a deixar o HC, dizendo que o HC não é um bom negócio para mim. A objetividade e o pragmatismo do conselho refletem bom senso nas finanças privadas. O seu conteúdo reflete o descaso do Estado com os médicos da rede pública de saúde e com o futuro de uma instituição cujas contribuições assistenciais e para a pesquisa e educação médica são inigualáveis em todo o território nacional. A maioria dos médicos concursados do HC são funcionários do Estado atraídos pela fama da instituição. Eles se distinguem pela admirável formação acadêmica e excelência dentro de suas especialidades. Quase todos são profissionais humanitários, muito trabalhadores e que se dedicam aos seus pacientes de forma exemplar. Grande parte deles detém habilidades e notório saber valorizados além das fronteiras da instituição e do país. Quase nunca fazem greve e freqüentemente acumulam tarefas para que o hospital funcione. Muitos fazem pesquisas inovadoras, publicam artigos científicos e constantemente levam trabalho para casa. São médicos tão apaixonados pelo que fazem que não se deram conta de que poderiam entrar em um péssimo negócio. Com tantas qualidades, seria esperado que os médicos do HC fossem pelo menos remunerados adequadamente. O salário de qualquer médico deve, no mínimo, pagar o longo investimento na sua formação e nos cursos de reciclagem; deve também permitir que exerça sua profissão com dignidade e que seja modelo de saúde para os seus pacientes. A sua remuneração deve ainda compensar pela grande responsabilidade que carrega. As associações médicas estaduais sugerem hoje um piso de R$ 7.500 para atender tais necessidades. O HC paga um quinto desse valor. Não precisa ser economista para perceber que pagar para trabalhar não é um bom negócio. Enquanto a política de estagnação salarial no HC é péssima para os médicos, ela é desastrosa para toda a população. Sem a vontade governamental de resgatar salários de médicos e funcionários do HC, o elenco dos que vão dançar nessa história é gigantesco, e a coreografia, tragicamente previsível. Primeiro ato – Os prestigiados médicos que se aposentam não encontram candidatos à altura para substituí-los. Os novos médicos que ainda ingressam, quando dotados de um pouco de inteligência e bom senso, rapidamente abandonam seus cargos. Entreato – Pacientes graves de renda média e baixa não conseguem acesso a uma das poucas filas que restavam a sua disposição. Segundo ato – Sem médicos capacitados, o atendimento se torna precário, e a pesquisa, de baixa qualidade; não se produzem novos conhecimentos nem se consegue transmiti-los aos alunos da USP. Os prodigiosos passos alcançados pelo HC e pela Faculdade de Medicina da USP em tantas décadas já não mais impressionam nem beneficiam aqueles sentados em camarotes. As cortinas se fecham. O conselho do governador ilumina a cena. DAVI DE LACERDA, 36, graduado em medicina pela USP e residência em dermatologia pelo Johns Hopkins Hospital (Baltimore, EUA), é dermatologista em consultório e no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
(fonte UOL – Folha de São Paulo)

Um Comentário

  1. DR GUERRA,
    veja que maravilha, até médico esta rebelando-se no

    FLIT PARALIZANTE,

    como a Polícia Civil, o PSDB faz mal à saúde dos Médicos,
    Veja dr e demais colegas, o curriculo desse médico é fantastico, e ironicamente só

    comparavel ao CURRICÚLUN DOS FORMANDOS DO BARROZO BRANCO DA POLICIA MILITAR,
    apenas os oficiais canceres da policia não reclamam de salários, afinal para quem tem 2ºgrau tecnico e ganha igual a Delegado de Polícia, é o melhor négocio do mundo puxar saco de político corrupto do PSDB, PMDB E DEM.

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  2. SIM, DESCASO DO GOVERNO DO ESTADO COM SAÚDE, EDUCAÇÃO E SEGURANÇA PÚBLICA. CONVIVEMOS COM REPRESENTANTES GOVERNAMENTAIS QUE SÃO VERDADEIROS IRRESPONSÁVEIS, E QUE BRINCAM COM VIDAS!!
    ENQUANTO UNS LUTAM SALVANDO VIDAS( SEJA O MÉDICO, PROFESSOR OU POLICIAL), OUTROS CEIFAM NA IRRESPONSABILIDADE!
    REPRESENTANTES GOVERNAMENTAIS LADRÕES, SEM PÁTRIA, SOMENTE PENSANDO NA SUA AMBIÇÃO PESSOAL; NO SEU EGO!!

    MARAVILHOSO O DEPOIMENTO.
    MARAVILHOSO TER CONTATO COM PESSOAS DE CARÁTER!

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  3. DR GUERRA,

    PELO ANDAR DA CARRUAGEM, A PRÓXIMA VEZ QUE NOSSO “DIGNÍSSIMO” GOVERNADOR FOR INTERPELADO A RESPEITO DOS EXCELENTES SALÁRIOS QUE O ESTADO DE SÃO PAULO PAGA A SEUS SERVIDORES, VAI RESPONDER:

    “SE EU GANHASSE UM SALÁRIO DESSES, EU ME MATAVA…”

    ALGUÉM SE LEMBRA DISSO…

    QQ SEMELHANÇA NÃO É MERA COINCIDÊNCIA…

    O QI É O MESMO…

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  4. Caro dr DAVI.

    Lamento lhe informar, mas é assim que o desgoverno do PSDB trata seus funcionários pagando muito mal.
    E só ha um modo de se ganhar bem no Estado de São Paulo, fazendo como os oficiazinhos da policia militar é babamdo os testiculos de politicos ou melhor politiqueiros e do Escrementíssimo Senhor Desgovernador do Estado, não adianta tentar melhorar a saúde do estado para se ganhar bem.
    Bem vindo ao funionlismo público do estado de São Paulo.
    Espero que fique pois pessoas muitos pobles precisando de médicos competentes como o senhor.
    Um abraço.

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  5. Gostaria de enviar este texto pois é muito importante para a Saúde do nosso país!!!!!!!!
    Obrigada por publicar!

    São Paulo, sexta-feira, 03 de julho de 2009

    TENDÊNCIAS/DEBATES

    Remuneração digna para médicos do SUS

    DAVI DE LACERDA, MILTON ARRUDA MARTINS e MARCOS BOULOS
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    Pagar salários irrisórios aos médicos dá prejuízo. Eles acumulam empregos e plantões, tornando-se mais propensos a cometer erros

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    TRAMITA NA Câmara dos Deputados o projeto de lei 3.734/08, do deputado Ribamar Alves (PSB-MA), propondo modificação no artigo 5º da lei 3.999/61. Essa lei fixa o piso salarial dos médicos e dentistas, mas só daqueles empregados de pessoas físicas ou jurídicas de direito privado, como estabelece seu artigo 4º. Hoje, o valor desse piso é igual a três vezes o salário-mínimo. Se o projeto for aprovado, o piso subirá para R$ 7.000 -soma respeitosa aos deveres e responsabilidades dos médicos-, mas continuará sem beneficiar os que trabalham para o setor público.
    Em um país cujos salários da maioria de seus trabalhadores são pouco valorizados, é legítimo indagar: Os médicos, em média, já não ganham muito? Quais os benefícios, para o Brasil, de aumentar o piso salarial somente de médicos do setor privado? O valor do piso não deveria amparar também os vencimentos de médicos empregados da administração pública, nos moldes do Sistema Único de Saúde, instituído pela Constituição de 1988?
    Uma análise sintética revela que alguns médicos ganham muito trabalhando em seus consultórios privados. Muitos médicos ganham mais que a média da população, excedendo 60 horas semanais de trabalho em três ou mais empregos e muitos plantões. Entretanto, parte substancial dos médicos que trabalham para o SUS ganha em torno de R$ 1.500. Sem entrar no mérito da quantia, o piso é mecanismo que permite estabelecer um patamar de dignidade para que o médico possa cumprir o que a sociedade exige dele: obter boa formação acadêmica em regime integral durante seis anos; fazer residência para se tornar especialista; atualizar-se constantemente; formular diagnósticos elaborados e administrar tratamentos complexos, sem lesar os pacientes com suas decisões ou ações.
    A importância de um salário equitativo é a mesma para os médicos do setor privado e os do SUS. A Constituição é clara ao estabelecer, em seu artigo 7º, V, como direito do trabalhador o “piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho”. O artigo 39, que trata dos servidores públicos, dita em seu parágrafo 1º: “A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará: I – a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira; II – os requisitos para a investidura; III – as peculiaridades dos cargos”.
    Todos esses quesitos não devem diferir significantemente por ser o empregador do médico de direito público ou privado, visto que o atendimento ao paciente sempre tem que ser o melhor possível e que todo brasileiro tem direito a ser tratado com excelência ao utilizar os serviços do SUS. Pagar salários irrisórios aos médicos dá prejuízo. Médicos mal pagos são obrigados a acumular empregos e plantões, tornando-se mais propensos a cometer erros que podem custar a vida -resultantes da fadiga, das consultas apressadas para poder se deslocar entre os diversos empregos e da falta de tempo para estudo e lazer.
    Estabelecer salário digno para todos os médicos possibilitaria adequar o número de horas trabalhadas a níveis mais saudáveis, condizentes com suas responsabilidades. Consequentemente, o médico se tornaria mais produtivo e até custaria menos, considerando o elevado desperdício resultante de prescrições e retornos indevidos causados pela correria atual. Além de valorizar os profissionais atuais, a remuneração justa terá repercussões nas gerações futuras.
    Hoje, excelentes alunos são desencorajados de cursar medicina pelo medo de não conseguirem empregos que compensem o gasto exigido na formação. O piso incentiva que médicos talentosos se tornem estudiosos, que desenvolvam e repassem conhecimentos adequados à realidade do país, diminuindo nossa dependência da importação de medicamentos, equipamentos e know-how.
    O brasileiro tem o direito à assistência médica pública e eficaz assegurado pela Constituição Federal. É dever do Estado prover os mecanismos para que os recursos direcionados à saúde sejam otimizados em benefício dos usuários do SUS. Estabelecer vencimentos dignos para médicos do setor público faz parte desse dever. E, na ponta do lápis, sai mais barato pagar um bom médico do que remediar.

    DAVI DE LACERDA, 37, graduado em medicina pela USP e residência em dermatologia pelo Johns Hopkins Hospital (Baltimore, EUA), é médico em consultório privado e no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
    MILTON ARRUDA MARTINS, 55, médico, pós-doutorado pela Universidade Harvard (EUA), é professor titular da Faculdade de Medicina da USP.
    MARCOS BOULOS, 63, médico, é professor titular e diretor da Faculdade de Medicina da USP.

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