Provável presidenciável pelo PSB Joaquim Barbosa poderá ser o primeiro presidente negro autêntico genuinamente eleito pela maioria do povo 74

Joaquim Barbosa diz ser contra ‘posições ultraliberais’

Eduardo Kattah, com colaboração de Breno Pires, Igor Gadelha e Circe Bonatelli

Brasília

  • Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa (PSB) mantém em suspense a decisão de disputar ou não o Palácio do Planalto, mas já tem esboçado os pilares do discurso que deverá adotar em uma eventual campanha. Em conversas mais recentes, Barbosa indicou que pretende conciliar a bandeira ética com a social. O ex-relator do mensalão quer reforçar a imagem do juiz implacável com a corrupção e, ao mesmo tempo, se apresentar na economia como um social-democrata, favorável ao livre mercado, mas com ênfase no combate à miséria.

“Não sou favorável a posições ultraliberais num país social e estruturalmente tão frágil e desequilibrado como o Brasil, com desigualdades profundas e historicamente enraizadas”, afirmou Barbosa ao jornal O Estado de S. Paulo. “Basta um rápido olhar para o chamado Brasil profundo ou para a periferia das nossas grandes metrópoles para se convencer da inadequação à nossa ‘engenharia social’ dessas soluções meramente livrescas, puramente especulativas. Evidentemente, elas não são solução para a grande miserabilidade que é a nossa marca de origem e que nós, aparentemente, insistimos em ignorar.”

O interesse pelo pensamento de Barbosa invadiu os círculos do mundo político e econômico após ele se filiar ao PSB no início do mês e aparecer bem posicionado em pesquisas de intenção de voto. A avaliação corrente é de que o ex-ministro do Supremo tem alto potencial eleitoral, porque teria capacidade de arregimentar votos em diferentes polos ideológicos.

No Supremo, Barbosa foi o relator do mensalão federal, que resultou, em 2012, na condenação e prisão de integrantes da antiga cúpula do PT. Após se aposentar, em 2014, ele se tornou um crítico do impeachment da presidente cassada Dilma Rousseff. O ex-ministro tem evitado se manifestar sobre a condenação e prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Barbosa foi um defensor da possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, tema que hoje divide o Supremo. Sua atuação na Corte, aliás, deverá ser bastante explorada numa eventual campanha presidencial. Além da marca do mensalão, ele reivindica o papel de principal articulador da aprovação, no Supremo, da proibição das doações eleitorais de empresas. Em conversa com um antigo aliado, ele considerou essa decisão como “crucial” para uma depuração do sistema político nacional.

Em 11 de dezembro de 2013, o então presidente do Supremo colocou em julgamento a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 4650, sobre financiamento de campanhas eleitorais e votou contra doações de pessoas jurídicas. “A permissão para as empresas contribuírem para campanhas e partidos pode exercer uma influência negativa e perniciosa sobre os pleitos, apta a comprometer a normalidade e legitimidade do processo eleitoral, e comprometer a independência dos representantes”, afirmou na época em seu voto.

Nesse tema, ele enfrentou a oposição de Gilmar Mendes, que pediu vista e devolveu a ação ao plenário um ano e cinco meses depois. A conclusão da votação ocorreu em 2015, já com Barbosa fora do Supremo.

Administração

O ex-ministro ainda tenta se acostumar ao assédio após ingressar pela primeira vez em um partido político e entrar de vez no rol dos presidenciáveis. Barbosa acompanha com mais atenção a curiosidade em torno de suas posições e suas alegadas fragilidades: o temperamento muitas vezes explosivo e a falta de experiência administrativa. O segundo ponto lhe incomoda mais.

Doutor e mestre em Direito Público por universidades francesas, Barbosa reclama que tem uma vasta carreira e conhece a administração federal do Brasil como poucos. Antes de sua nomeação para o Supremo – onde ficou por 11 anos -, ele foi integrante do Ministério Público Federal de 1984 a 2003, com atuação em Brasília e no Rio. De 1985 a 1988, trabalhou no Executivo ao chefiar a consultoria jurídica do Ministério da Saúde.

“Conheço muito bem o Estado brasileiro, suas virtudes, seus defeitos, visíveis ou invisíveis. Nele trabalhei desde muito jovem, nas mais diversas esferas, dos níveis mais modestos aos mais elevados”, afirmou Barbosa ao jornal.

Autores

Desde que se filiou ao PSB, há 20 dias, o ex-ministro recebeu diversos convites de economistas e escolas, dispostos a entender o que ele pensa sobre o tema. Segundo interlocutores, Barbosa tem pouca familiaridade com economistas nacionais e costuma se informar por meio da leitura de autores estrangeiros.

Acompanha semanalmente o americano Paul Krugman, professor da Universidade de Princeton, vencedor do Nobel de Economia de 2008 e colunista do The New York Times. Krugman é um adepto do keynesianismo, teoria baseada nas ideias do inglês John Maynard Keynes, que defendia a ação do Estado na economia.

O ex-ministro também é admirador e leitor de Francis Fukuyama, cientista político e economista que foi um do ideólogos do governo Ronald Reagan nos Estados Unidos, além de autor de best-sellers. Um terceiro nome que Barbosa costuma citar em rodas de conversa é o economista francês Thomas Piketty, que ganhou fama internacional em 2013 com seu livro O Capital no século XXI.

No ano passado, o ex-presidente do Supremo se encontrou com Eduardo Giannetti para tratar do cenário eleitoral, mas a intenção do economista ligado a Marina Silva era tentar uma aproximação dele com a pré-candidata da Rede. “Conversamos de tudo, menos economia”, disse Giannetti, que saiu do encontro convencido de que uma dobradinha Marina-Barbosa se mostrou “inexequível”.

A decisão sobre uma candidatura presidencial ainda é um dilema pessoal para o ex-ministro. Após deixar o Supremo, ele passou a atuar como advogado focado na elaboração de pareceres jurídicos. A experiência na mais alta Corte do País e o notável currículo acadêmico lhe garantem alto rendimento financeiro. A opção pela política teria impacto na vida de familiares.

Manifesto

Essa situação, segundo aliados de Barbosa, deixa o PSB “ansioso”. A bancada do partido na Câmara vai divulgar em breve manifesto para pressionar o ex-ministro a lançar a pré-candidatura. “(Barbosa) tem demonstrado identidade com valores caros ao ideário do PSB, como a defesa de uma sociedade plural, humanista, inclusiva e diversa, sem preconceitos”, afirma o texto.

Nos cenários do mais recente levantamento do Datafolha, que incluem ou excluem Lula, o ex-ministro alcança de 8 a 10 pontos porcentuais e fica à frente ou empatado (dentro da margem de erro) de pré-candidatos já consolidados como Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT). Na pesquisa Ibope/TV Bandeirantes divulgada nesta terça, 24, e feita com eleitores do Estado de São Paulo – maior colégio eleitoral do País, com 33 milhões de votantes -, Barbosa chega a 10% da preferência, empatado tecnicamente com Marina em cenários sem Lula.

Antes de se filiar ao PSB, no início de abril – prazo final da legislação -, Barbosa conversou com dezenas de interlocutores por cerca de um ano. No momento, segundo pessoas próximas, sua maior preocupação é evitar que uma candidatura seja tratada como automática caso seu nome continue bem avaliado nos levantamentos eleitorais. O ex-ministro ainda joga com o tempo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Jusfilósofo Lenio Luiz Streck: Manual do comentarista de site, internet e quejandos…Serve na medida para alguns comentaristas do Flit, especialmente os “pulícia adevogados”, esbirros direitistas cristãos, nacionalistas e fascitas separatistas “ 33

SENSO INCOMUM

Manual do comentarista de site, internet e quejandos

Por Lenio Luiz Streck

A coluna de hoje é um pouco diferente das anteriores. Em tempos de direito de exceção, resolvi aproveitar para oferecer um guia “simplificado-passo-a-passo” para alguns objetivos. Ei-lo:

A. Como ser um comentarista
1) Abra uma coluna na ConJur, dessas que são críticas, como “Senso Incomum”.

2) Não leia a coluna até o final — afinal, se você é contra “por princípio”, por que ler até o final?

3) Epinafre o articulista (aqui é livre: pode xingar de comunista, kelseniano (sic), defensor de bandido, como queira; o importante é xingar). E, se ler, seja contra, sempre. De preferência, use pseudônimo. Invente algo engraçado, mas épico ou exótico (ou algo como transporte paralelo dos lacetes). Há vários na ConJur. Diga algo como “Kant se equivocou, Heidegger seguiu o caminho torto de Kant, e Gadamer apontou para a solução do problema — a necessidade de uma hermenêutica teológica, que condiciona a jurídica —, mas não soube como fazê-lo, porque não entendeu Hegel, o filósofo que mais chegou perto da Verdade” — e… Pronto: corra para o abraço. Mas permaneça no anonimato. E já aproveite e critique esta coluna de hoje, de forma raivosa. Será uma metacrítica (já aproveite e critique o uso dessa palavra, para não perder a viagem).

4) Você já deve ficar esperando a próxima coluna. Deixe o comentário engatilhado. Para ser um dos primeiros. Não esqueça que, como você não lê a coluna, você pode xingar qualquer coisa. Não fará diferença para o seu onanismo epistêmico. Mas, se ler, aproveite o comentário já feito. Por que desperdiçá-lo?

5) Vaie até minuto de silêncio. É uma metáfora, porque vi gente vaiando até medalha ganha pelo comentarista! Poxa, nem na felicidade…!

6) Fundamentalmente, faça discursos raivosos. Odeie. Sempre deixe explicito ou implícito que você é o “cara”.

B. Como ser um “jurista moderno”
1) Diga que coisas como “lei”, “Constituição” e “verdade” para nada servem e que sequer existem; proclame-se um “cara prático”; diga que é pragmático, é mais chique; diga que o que vale mesmo é “saber” como os juízes decidem (pior é que você pode não ser juiz e então estar ferrado!); guarde uma frase de Nietzsche no bolso e meta Hegel (veja que já teve promotor colocando Hegel no lugar de Engels) em qualquer buraco de fala, até mesmo na discussão sobre o livre convencimento ou do artigo 489 (confunda seus leitores: use motivação em vez de fundamentação, dizendo que isso é a mesma coisa); também quando discutir processo civil, atravesse um “hegelianamente falando…”. Uma pitada de luta de classes vai bem também. E, claro, poste no Facebook. Isso é indispensável. Ah: ironize o colunista, para mostrar como você é o cara que deveria estar no lugar dele.

2) Dedique-se a defender coisas da moda: pode até mesmo citar aquela professora americana que diz que Direito é como baseball — fica muito chique; cool!

3) Para fechar, repita as máximas realistas do século XX com ares de novidade. E não esqueça de dizer que isso já estava claro nas obras de (cite umas cinco tiradas da internet); mas não esqueça de dizer que o que vale é “a prática”. Sempre desdenhe da teoria. E diga que o colunista só critica e não apresenta soluções. Essa frase é xeque-mate! E, de preferência, poste no Face sua façanha.

4) Uma coisa que pode dar certo e ficar cool é dizer coisas como “a sociedade mudou, e que as garantias processuais e trabalhistas são coisas que atravancam o desenvolvimento do país”, e que você faz isso “porque quer emprego para todos”. Você passará por magnânimo. E aproveite para dizer coisas como “quem for contra a reforma trabalhista não quer o progresso”.

5) Não esqueça de dizer, também, que foi a Constituição de 1988 que incentivou a impunidade. Isso pega sempre muito bem na comunidade nescial. E poste no Facebook dizendo que você venceu a discussão. Ah: imite alguém importante e feche o artigo com uma frase ou uma palavra de seu “adversário” (que nem lhe dá bola, mas o gozo é seu, não é?). Feche com “bingo”!

6) Qualquer problema ou dúvidas quanto a sua capacidade de se tornar vitorioso, assuma o Pigeon Factor (Fator Pombo — vai ter que ler a nota de rodapé! Ah, vai!): suje o tabuleiro, espalhe as peças, bique os dedos do adversário e saia com o peito inflado[1].

7) Poste no Facebook que você venceu a discussão. Diga que você derrotou fragorosamente seu adversário.

C. Como aplicar o CPC/2015
1) Faça um ar blasé, um pouco de suspense e anuncie que o “juiz boca da lei” morreu. Isso nunca falha. Isso é indispensável em qualquer discussão. E acrescente: agora é a vez do juiz dos valores; diga isso com ar superior e dramático, esperando que a plateia venha abaixo. E não esqueça de avisar que “qualquer um sabe que interpretação é um ato de vontade”. E não esqueça do postar no Facebook que você venceu a discussão.

2) Incentive o novo: desdenhe as teorias da decisão, dizendo: “Qualquer um sabe que o juiz primeiro decide para só depois fundamentar”. Você deve dizer, também, que “tirar o livre convencimento do novo CPC foi uma bobagem” (e se estiver escrevendo isso no Facebook, a ágora dos néscios, ponha algum potássio nisso, isto é, lasque uma série de kkkkks), concluindo com chave de ouro: “Qualquer um sabe que o juiz tem e sempre terá livre convencimento”. E gize: “E é por isso que, estando o juiz convencido, ele não precisa ouvir o que as partes têm a dizer”. E cite um enunciado do último workshop. Diga: e eu estive lá e ajudei a elaborar! Supimpa. Pronto: você é candidato a ser o jurista do ano.

D. Como se tornar um expert sobre a presunção da inocência
1) Já de cara, entre de sola e diga: presunção da inocência é para proteger bandidos. Isso nunca falha. Diga que, finalmente, os maus estão perdendo. Mesmo sendo da área do Direito, esculhambe com a Constituição.

2) Ou diga que quem defende a presunção da inocência quer proteger corruptos. E corra para o abraço. E poste no Face que você arrasou.

3) Diga que a literalidade da CF resulta em impunidade; mas também pode dizer o contrário. Afinal, você segue a doutrina do humptidumptismo. E, é claro, não esqueça de colocar no Face dizendo que você arrasou.

POST SCRIPTUM: um lamento!

É impressionante o que construímos neste país. Uma geração de pessoas (de)formadas em Direito. Racionalidade zero. Estado de insolvência epistêmica. Tudo virou narrativa. Nada lhes foi ensinado sobre decidir por princípio (com responsabilidade política). Não lhes foi ensinado “o que isto — o direito”. E, engraçado: fizeram o curso de… Direito. Ensina-se uma péssima teoria política do poder. Impressiona o nível de baixa constitucionalidade dos cursos jurídicos e o baixo aprendizado.

Estamos diante de uma tempestade perfeita para qualquer regime autoritário. É o Direito se autodevorando. É o fator acídia (aqui). Vibra-se quando o juiz diz que estamos em tempos de jurisprudência de exceção. Sim, isso mesmo! Diz-se que garantias incentivam a impunidade. E coisas desse baixo quilate.

Claro: quando se sabe pouco de Direito, melhor é transformar tudo em política, moral ou economia. Afinal, são esses os predadores naturais do Direito.

O neojurista que estudou por aí agora pede passagem. Rumo ao abismo. E, pior: o abismo fica no final de uma descida.


[1] Vejam esta pesquisa: 100 estudantes de Direito, professores e profissionais lato sensu da área jurídica foram submetidos a uma pesquisa pelo pool de universidades: Shimer University II , Scheizwald II e Matocagao III. Todos jogaram xadrez durante um dia inteiro com pombos e aprendizes de pombos. Resultado:
– 12% dos pombos e aprendizes de pombos fizeram caca no tabuleiro;
– 17% esculhambaram as peças, espalhando-as com o bico e os pés;
– 36% fizeram caca no tabuleiro, esculhambaram as pedras e bicaram os dedos do adversário;
– 35% fizeram tudo o que os demais fizeram e foram xingar o adversário no Facebook;
Ponto em comum: 100% dos pombos saíram com o peito estufado dizendo que venceram o jogo; e 100% dos aprendizes de pombos saíram de peito estufado, gritando e postando no Facebook o sucesso de suas jogadas, com frases tipo “estrondosa vitória dos pombos e dos aprendizes de pombos no jogo de xadrez do século”.
Portanto, como jogar xadrez com pombos e aprendizes de pombos? Impossível. A derrota é certa.

Supremo autoriza membros do MP a grampear telefones e quebrar sigilo 13

REGRA DO CNMP

Supremo autoriza membros do MP a grampear telefones e quebrar sigilo

Por Marcelo Galli

Por maioria, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional norma do Conselho Nacional do Ministério Público que autoriza membros do MP a grampear telefones e endereços de e-mail e a quebrar sigilo de comunicações em investigações tocadas diretamente pelo órgão. A corte, no entanto, disse que as medidas só podem ser adotadas com autorização judicial.

Conforme a Lei 9296/96 (Lei de Interceptação Telefônica), é papel da autoridade policial conduzir os procedimentos de interceptação. Já a Resolução 36/2009 permite a prática nos procedimentos conduzidos dentro do próprio MP, se o juízo for regularmente informado sobre o passo a passo da medida.

No mesmo ano da norma, porém, a própria Procuradoria-Geral da República protocolou ação no Supremo questionando o texto. Para a PGR, o CNMP ultrapassou sua competência constitucional regulamentar e interferiu na autonomia funcional dos membros do MP.

Supremo autorizou que membros do MP grampeiem telefones em investigações tocadas diretamente pelo órgão.

O relator, ministro Luís Roberto Barroso, venceu nesta quarta-feira (25/4) ao entender que a resolução apenas estabelece “regras triviais” para preservar o sigilo do cidadão, chamando atenção para o dever funcional do membro do MP em relação a esses procedimentos.

“Se o CNMP pode punir membro do órgão que agiu em desconformidade com as regras do MP de conduta, tem competência também para definir em abstrato o comportamento pretendido”. Não foi o sentido da resolução, segundo Barroso, regular a Lei 9296/96 (Lei de Interceptação Telefônica).

Para ele, quanto mais alongada a escuta, maior deve ser o “ônus argumentativo” que autoriza os procedimentos.

O texto estabelece a obrigatoriedade de que o promotor ou procurador responsável pela investigação criminal ou instrução penal comunique, mensalmente, à Corregedoria-Geral, por meio eletrônico, em caráter sigiloso, dados relativos a interceptações em andamento, bem como aquelas iniciadas e encerradas no período.

Barroso defendeu também trecho da resolução do CNMP que diz que as partes relevantes das conversas telefônicas devem ser documentadas e transcritas de maneira integral, sem edição, para evitar interpretações indevidas e ilações por causa da falta de contexto.

O caso, que chegou à corte em 2009, era originalmente relatado pelo ministro Joaquim Barbosa. O relator atual é o ministro Luís Roberto Barroso, autor do voto vencedor.

Segundo o ministro Barroso, a resolução não cria requisitos formais para validar a interceptação, mas apenas normas administrativas que vão nortear a conduta do MP nesses casos. “As regras não violam a independência funcional dos membros do MP, já que não impõem uma linha de atuação ministerial”. Ainda de acordo com ele, a existência mínima de padrões naquele sentido atende ao princípio da eficiência e garantem a continuidade regular de investigações.

Para Alexandre de Moraes, CNMP extrapolou atribuições ao autorizar que membros do MP conduzam grampos em investigações por conta própria.
Carlos Moura/SCO/STF

O ministro Alexandre de Moraes foi o primeiro a divergir do relator. Segundo ele, o CNMP extrapolou seu poder normativo e interferiu na atuação fim do Ministério Público.

“Assim como o Conselho Nacional de Justiça não poder editar normas processuais que devem ser respeitadas pelos magistrados, por exemplo, o CNMP não pode editar resoluções para estabelecer regras processuais e procedimentais para interferir na atuação finalística do MP”, defendeu.

Na opinião de Alexandre, somente a Lei 9296/96 pode ditar a forma, o modo e hipóteses da quebra do sigilo, conforme diz a Constituição. Afirma ainda que o CNMP interferiu indevidamente na atividade terceiros que não membros do MP, como juiz, polícia e empresas de telefonia.

De acordo com o voto do mais novo membro do STF, a resolução acaba por permitir que o próprio membro do MP peça a quebra do sigilo à empresa para fazer a investigação, o que não é permitido pela legislação. Ele explica que quem pede a quebra é a polícia, após a sua autorização pelo magistrado, sendo o papel do MP de acompanhamento da diligência.

Barroso rebateu os argumentos de Alexandre, dizendo que a resolução não cria nova hipótese de quebra de sigilo fora da legislação brasileira. “Não se trata de regulamentação de direito fundamental sem lei. Trata-se de regras de autocontenção do MP em favor dos direitos fundamentais”, reafirmou.

O ministro Luiz Edson Fachin, ao acompanhar o relator, concordou com o argumento de que o CNMP não ampliou as hipóteses em que é possível a quebra do sigilo. Lembrou também que, conforme a Constituição, o MP exerce controle externo da atividade policial. “A resolução está cumprindo o que diz a Constituição”, afirmou Fachin.

Os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio acompanharam a divergência. Votaram com o relator, além de Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Mendes lembrou que o Supremo reconheceu a poder autônomo investigatório do MP, mas em caráter subsidiário, complementar, ao realizado pela polícia judiciária.

Segundo ele, o MP tem adotado investigações internas, os chamados procedimentos investigatórios criminais, que, diferentes dos inquéritos normais, que são controlados pelo Judiciário, estão sob controle da própria instituição.

Na opinião dele, os PICs lembram investigações que eram feitas no Brasil pelo regime militar. “É preocupante que exista a possibilidade de interceptação a partir de um PIC. Estamos falando de direitos e garantias individuais”. De acordo com Gilmar, Rodrigo Janot, ex-procurador-geral da República, deixou cerca de 800 PICs em tramitação quando deixou o cargo.

O ministro Ricardo Lewandowski disse que a lei sobre interceptações regulamentou a matéria exaustivamente. Afirmou também que quebras de sigilo feitas com base na resolução do CNMP podem motivar a nulidade do procedimento por vício formal. “Podemos, de maneira profilática, evitar a declaração de nulidade em futuras investigações submetidas ao Poder Judiciário”.

ADI 4.263

* Texto atualizado às 20h05 do dia 25/4/2018 para acréscimo de informações.