Brasil revê maioridade penal sem ter mapa da criminalidade juvenil 52

ÉRICA FRAGA
REYNALDO TUROLLO JR.
FOLHA DE SÃO PAULO

07/06/2015 02h00

O Brasil discute a redução da maioridade penal, mas não possui estatísticas que dimensionem a participação de jovens nos crimes no país.

Neste mês, a Câmara dos Deputados deverá votar uma Proposta de Emenda à Constituição que visa reduzir a idade penal de 18 para 16 anos.

Devido à falta de dados nacionais
, ao longo de dois meses, a Folha solicitou números de envolvimento de menores em delitos às 27 unidades da Federação. Nove forneceram estatísticas, com base em metodologias variadas.

Embora mostre um retrato parcial, o levantamento traz indicações. Revela que, nos nove Estados, a participação de menores em homicídios com autoria conhecida não é insignificante, como autoridades têm dito. Em sete Estados, é igual ou superior a 10%.

Procurado, o ministério negou a autoria da conta e a atribuiu ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A entidade, porém, afirmou nunca ter feito tal cálculo justamente por falta de dados oficiais.

Estimativa de que menores responderiam por 1% das mortes também já foi atribuída ao Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), que nega ser fonte do dado.

CASOS EXTREMOS

O Distrito Federal informou uma participação de menores em homicídios de 30%. A fatia é parcialmente explicada pela disseminação de brigas de gangues na capital.

Já no Ceará, os menores estiveram envolvidos em 30,9% dos crimes violentos letais intencionais em 2014. Esse número pode ser puxado para cima por incluir latrocínios.

As estatísticas
obtidas mostram que adolescentes se envolvem mais em latrocínios do que em homicídios.

Editoria de Arte/Folhapress

No Maranhão, jovens responderam por só 3,1% dos homicídios da capital, mas por 15,2% dos latrocínios, em 2014. Mato Grosso é outro caso de baixo envolvimento em assassinatos: 3,9%. Ainda assim, os percentuais superam os supostos 0,5% e 1%.

Se a participação de menores em crimes não é insignificante, tampouco é o índice de jovens alvo de violência.

Adolescentes de 16 e 17 representaram 6,6% das vítimas de homicídio no país em 2013, embora sejam apenas 3,6% da população. Os dados farão parte do novo Mapa da Violência. Homicídios são a principal causa de morte nessa faixa etária: 46% do total.

Transcrito da Folha de São Paulo ; nos termos do artigo 46 da Lei nº 9.610, de 19 de Fevereiro de 1998.‏

“Plantação de Provas” – Brasil é obcecado pela severidade penal, mas brando quando cuida das polícias 15

VIOLAÇÕES COTIDIANAS

6 de junho de 2015, 12h15

Por Luís Francisco Carvalho Filho

[* Texto originalmente publicado em coluna da Folha de S.Paulo deste sábado (6/6), no caderno Cotidiano, com o título “Plantação de Provas”.]

O Brasil é obcecado pela severidade penal, mas é brando quando cuida das polícias.

A sucursal da Folha no Rio noticiou a condenação de dois oficiais da PM por forjarem um flagrante contra adolescente, durante repressão a protesto em outubro de 2013.

Sabidamente inocente, o rapaz foi algemado (não havia esboçado nem um gesto de resistência) e “conduzido” até uma delegacia. A PM plantou morteiros em seu poder, simulando uma periculosidade irreal, e ignorou sua menoridade, expondo-o à suspeita e ao vexame.

A vítima do singelo arbítrio, tão comum, teve sorte porque a fraude foi percebida por testemunhas e filmada. O vídeo divulgado por O Globosubsidiou a sentença da Auditoria Militar do Rio de Janeiro e mostra, passo a passo, a construção do grotesco abuso de poder.

O policial (seu dever é a proteção das pessoas) que subtrai a liberdade de alguém indevidamente, ainda mais falsificando dolosamente evidências de um suposto crime, pratica ato mais grave e mais danoso do que o roubo de R$ 100, sem violência, que aqui pode ser punido com cinco anos e quatro meses de reclusão em regime fechado.

A condenação aos oficiais pelo delito de constrangimento ilegal, definido no Código Penal Militar, é pequenininha: um mês e seis dias de detenção, comsursis (suspensão condicional da pena), já que, de fato, o encarceramento não contribuiria para a “ressocialização” dos réus, que permanecem na ativa, prontos para, de novo, “arrepiar”.

Plantar provas é corriqueiro. Armas aparecem do nada para simular tiroteios. Drogas aparecem do nada para a extorsão de transeuntes. Testemunhas aparecem do nada para criação de álibis ou falsos desacatos. O que surpreende é a desproporção entre delito e pena.

Somos duros com muitos, indulgentes com outros.

Incompreensível, também, que a função policial (exercida por agentes treinados como militares) permaneça submetida à jurisdição e às leis militares, que consideram mais grave a homossexualidade no quartel do que inventar flagrante nas ruas. República de bananas.

A PM age nas cidades e os abusos são praticados contra civis: por isso, assim como os delegados de polícia, deveria estar submetida à Justiça comum. A única exceção, estabelecida pela Lei 9.290/96, proposta por Hélio Bicudo, marco institucional contra a impunidade, é o homicídio praticado pelo soldado, que passou a ser julgado pelo tribunal do júri – em tese mais isento e menos suscetível à visão e aos interesses corporativos.

Mas não se iludam. Se os mesmos oficiais fossem julgados pela Justiça comum, a pena também seria irrisória. A Lei 4.898/65, entulho deixado pela ditadura militar, permite que abusos de autoridade sejam reprimidos com multa.

Por que o Congresso Nacional se omite em relação às violações cotidianas das nossas polícias?

A bancada da bala prevalece, a bancada da cidadania sucumbe. Não temos estatuto legal capaz de disciplinar a ação repressiva, prevenir excessos e condenar com rigor os abusos cometidos.

A suavidade penal em matéria de proteção das garantias constitucionais é a senha para o desmando.

Afeta a paz pública, gera insegurança. É uma ameaça concreta e permanente a todos nós.

STF deve julgar descriminalização do porte de drogas para consumo próprio 22

PÚBLICO X PRIVADO

CONJUR

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, deve liberar para votação, na próxima quarta-feira (10/6) seu voto em um processo no qual um cidadão recorre contra punição por porte de drogas. Segundo a coluna da jornalista Sonia Racy, no jornal O Estado de S. Paulo deste sábado (6/6), a tendência é que ele decida a favor do autor  – o que, na prática, descriminalizaria o consumo pessoal. Para a matéria já foi reconhecida repercussão geal.

O homem foi condenado a dois meses de prestação de serviço à comunidade por ter sido flagrado com três gramas de maconha. A Defensoria Pública de São Paulo, que recorre contra a punição, alega que a proibição do porte para consumo próprio ofende os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada.

Defensoria tenta anular condenação por porte de maconha; ministro Gilmar Mendes é o relator do processo no STF.
Carlos Humberto/SCO/STF

O crime está previsto no artigo 28 da Lei 11.343/06, que fixa penas para “quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização”.

Como o caso teve repercussão geral reconhecida, a decisão deve impactar outros processos em todo o país. Ainda seria preciso estabelecer regras sobre produção, venda e a quantidade que configura “uso pessoal”.

Em 2011, quando o tema entrou no Supremo, a Procuradoria-Geral da República posicionou-se contra a descriminalização. Em parecer, declarou que a lei protege a saúde pública, “que fica exposta a perigo pelo porte da droga proibida, independentemente do uso ou da quantidade apreendida”, pois contribui para a propagação do vício na sociedade.

Repercussão
Diversas entidades entraram como amicus curiae no processo, como a Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia (CBDD), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), a Conectas Direitos Humanos e a Pastoral Carcerária.

Advogados de renome estão representando essas associações no processo, como o professor da USP e colunista da revista Consultor JurídicoPierpaolo Cruz Bottini (CBDD), o criminalista Arnaldo Malheiros Filho (IDDD) e a professora da USP Marta Cristina Cury Saad Gimenes (Ibccrim).

Em 2013, ex-ministros da Justiça dos governos Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) enviaram um ofício ao ministro Gilmar Mendes, relator do RE 635.659, defendendo a descriminalização do porte de droga para uso próprio. Assinaram o documento Márcio Thomaz Bastos, Nelson Jobim, José Carlos Dias, José Gregori, Aloysio Nunes, Miguel Reale Junior e Tarso Genro.

No ofício, os ex-ministros argumentaram que “cada cidadão tem liberdade para construir seu próprio modo de vida desde que respeite o mesmo espaço dos demais” e que “não é legítima a criminalização de comportamentos praticados dentro da esfera íntima do indivíduo que não prejudiquem terceiros”.

Eles classificaram a guerra às drogas “um fracasso” e apontaram que “tratar o usuário como cidadão, oferecendo-lhe estrutura de tratamento, por meio de políticas de redução de danos, é mais adequado do que estigmatizá-lo como criminoso”. Citaram ainda como experiências bem-sucedidas exemplos de países como Portugal, Espanha, Colômbia, Argentina, Itália e Alemanha.

Guerra fracassada
Os governos latino-americanos estão resistindo aos princípios da abordagem dos Estados Unidos no combate às drogas, contestando estratégias como a proibição, a erradicação de plantações e o combate militarizado aos cultivadores. A tendência é apontada pelo suplemento do New York Times no jornal Folha de S.Paulo deste sábado.

A Colômbia acaba de barrar a pulverização aérea da coca, a planta da qual é feita a cocaína – elemento essencial da tática de combate dos EUA. A Bolívia expulsou a DEA (a agência norte-americana de combate às drogas) do país há anos e permite o cultivo de pequenas plantações de coca. A Guatemala estuda a criação de mercados legais para algumas drogas. Mas o principal exemplo dessa mudança é o Uruguai, que está regulamentando a produção, a venda e o consumo de maconha.

“Pela primeira vez em 40 anos, está ocorrendo um movimento importante de resistência desses países, que são os que suportam boa parte do sofrimento provocado por essa guerra”, disse à publicação o historiador Paul Gootenberg. A resistência reflete o declínio da influência dos EUA sobre a América Latina e o consentimento de que os métodos norte­americanos de combate às drogas fracassaram.

Enquanto isso, o Brasil estuda a possibilidade de substituir a pena de reclusão em caso de porte de drogas por medidas alternativas, como prestação de serviços comunitários. No entanto, por falhas na norma, ocorreu o oposto, e o número de presos por crimes relacionados a drogas não para de crescer, aponta a reportagem.

RE 635659

Efeitos da queda da idade penal 16

Adriana Bernardes , Marcella Fernandes

Tema polêmico
Efeitos da queda da idade penal
Se aprovada no Congresso, a redução da maioridade para 16 anos pode causar uma confusão em várias áreas da legislação, autorizando consumo de bebidas e exames de habilitação, por exemplo. (Foto: Reprodução)

Redução da maioridade penal, você é contra ou a favor? O tema é tão polêmico e desperta tantas paixões que a resposta a essa pergunta costuma sair de pronto. O que pouca gente sabe é que uma possível alteração na lei vai provocar mais do que cadeia para adolescentes infratores. Se aprovada pelo Congresso, a redução da maioridade para 16 anos pode causar desdobramentos em diversas outras áreas da legislação.

De acordo com o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Ayres Britto, a referência aos 18 anos está em diferentes matérias, como a eleitoral e a trabalhista. “As coisas estão entrelaçadas.” Ele alerta que, apesar de não causar mudanças automáticas, a redução abre precedente para questionar, por exemplo, o limite de idade para dirigir e para ser obrigado a votar.

Britto ressalta que haverá necessidade de se reinterpretar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), uma vez que o documento trata tanto da proteção quanto da punição de brasileiros entre 12 e 18 anos. “O entendimento da Constituição é que o desenvolvimento da personalidade não se perfaz senão a partir de 18 anos. Até essa faixa etária, a Constituição diz que o indivíduo está em formação”, explica. Para o ministro aposentado, a redução viola cláusula pétrea da Constituição.

O Correio ouviu especialistas de diferentes áreas para entender os reflexos da alteração em leis trabalhistas, trânsito e no próprio ECA. A preocupação é compartilhada pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello. “É razoável você dizer que responde como adulto e ao mesmo tempo ser proibido de conduzir um veículo automotor?” Ele lembra que tais reflexos vão depender da precisão do texto aprovado, que pode, por exemplo, restringir a redução da maioridade apenas em casos de infratores que cometam crimes hediondos. Mello avalia que a PEC vai aumentar o encarceramento e não reduzirá a criminalidade. “Entre prós e contras, os contras sobrepujam os prós. Eu não vejo como algo desejável”, afirma.

Colcha de retalhos jurídicos

TRABALHO
No âmbito trabalhista, apesar de a redução da maioridade penal não causar alterações diretas, pode motivar discussões para futuras mudanças. “A redução da maioridade penal não afeta diretamente as relações trabalhistas, contudo inicia-se assim mais uma discussão sobre o abandono escolar para a entrada de jovens no mercado de trabalho em atividades que hoje são vedadas”, explica o advogado trabalhista Marcílio Braz. A legislação atual impede o trabalho para menores de 14 anos. Entre 16 e 18, há restrições, como não trabalhar em ambiente penoso, insalubre, perigoso, que prejudique a formação moral e psicológica, desenvolvimento físico, além de trabalho noturno. Menores tampouco podem fazer hora extra, e o empregador é obrigado a ceder tempo necessário para o comparecimento às aulas.“Hoje, essas proibições mantêm o jovem na escola. Qualquer alteração nessa legislação trará graves prejuízos aos jovens, que são o futuro de nosso país”, afirma Braz. O critério usado é que pessoas nessa faixa etária ainda estão em fase de desenvolvimento. O argumento encontra respaldo nas outras esferas do direito brasileiro, além das normas internacionais ratificadas pelo Brasil, como a Convenção nº 138 da Organização Internacional de Trabalho (OIT). Há, ainda, uma relação direta com a possível liberação do consumo de bebidas alcoólicas, uma vez que é proibido o trabalho de menores em estabelecimentos que comercializam esse tipo de produto.

HABILITAÇÃO
O efeito cascata da redução da maioridade penal pode colocar atrás do volante adolescentes de 16 anos. Isso porque a primeira condição para um brasileiro se habilitar a conduzir um veículo é ser plenamente imputável. Para o professor de Direito Penal e Processual e conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-DF) Rafael Augusto Alves, com a aprovação da emenda, o efeito automático na legislação de trânsito só não acontecerá se o Congresso criar mecanismos que impeçam a extensão dos direitos e deveres. “É preciso ver como o texto será aprovado. A imputabilidade será para toda e qualquer espécie de infração penal ou vai se restringir a crimes hediondos, por exemplo? Mas há uma questão mais profunda ainda. É um despautério discutir redução da maioridade penal. Se o ECA fosse cumprido integralmente, talvez não precisássemos disso”, defende. Caso a PEC seja realmente aprovada, o Brasil terá que repensar a formação do condutor. Doutor em estudos de transportes, o professor da Universidade de Brasília (UnB) Paulo César Marques entende que não há restrição do ponto de vista cognitivo para um adolescente de 16 pegar o volante. Mas defende a necessidade de um “esforço adicional” na formação dos futuros motoristas, porque há diferenças consideráveis do ponto de vista da maturidade. “Teoricamente, se uma pessoa com 16 anos pode votar e decidir o futuro do país, ela pode conduzir um carro. Mas a maturidade precisa ser mais trabalhada e o processo de formação necessitaria ser ajustado para a nova realidade”, destaca Marques. Diretor de Policiamento e Fiscalização de Trânsito do Detran-DF, Silvain Fonseca não tem dúvidas sobre o que chama “efeito dominó” da redução da maioridade penal na legislação de trânsito. “Se isso acontecer, o Estado terá que reforçar a educação, além de trabalhar as questões de maturidade e comportamento nas vias. Teremos um perfil novo de condutores e seremos obrigados a pensar como seria a forma de capacitação desse público,” afirma.

VENDA DE ÁLCOOL
A prevenção ao uso de drogas lícitas, como o álcool, está no pacote de normatizações que poderão ser afetadas diretamente pela redução da maioridade penal. Há menos de dois meses, a presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei Federal nº 13.106, que torna crime a venda e a oferta de bebidas alcoólicas e outras drogas que podem causar dependência, a menores de 18 anos. “É um risco”, diz Alessandra Diehl, psiquiatra e secretária da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead). “Seria ingenuidade dizer que não há. Vivemos num país em que está difícil acreditar nas leis e nos parlamentares. Há um interesse econômico que se sobrepõe ao direito à saúde da população como um todo”, lamenta . Alessandra diz não enxergar um desdobramento imediato, uma vez que a legislação que veta a venda e oferta de drogas lícitas e ilícitas a menores de 18 anos está bem fundamentada. Mas, por outro lado, ela não descarta que as indústrias tabagista e cervejeira, por exemplo, façam lobby para mudar a norma legal. “O Brasil aprovou a restrição à venda de bebida alcoólica em estádio. Veio a Fifa e derrubou a proibição na Copa do Mundo”, lembra. Atualmente, quem desrespeita a Lei 13.106 pode ficar preso por dois a quatro anos e pagar multa de até R$ 10 mil.

EXPLORAÇÃO SEXUAL
A redução da maioridade penal criaria uma situação contraditória em que um jovem de 16 anos pode ser punido por um crime como adulto, mas continua sendo protegido como adolescente, uma vez que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) — que trata da faixa etária de 12 a 18 anos — continuaria vigente. “Desmontaria todo o sistema legal de proteção da juventude, então geraria uma série de incompatibilidades e contradições nos diferentes sistemas”, explica Sinara Guimieri, consultora jurídica do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero. “A aprovação criaria um precedente perigoso para que o Congresso venha a reformular o ECA”, reforça a procuradora da República Mariane Guimarães. Se o ECA for alterado, crimes cometidos contra adolescentes entre 16 e 17 anos seriam descaracterizados. Entram nessa categoria exploração sexual, pornografia infantil, sequestro e tráfico internacional de pessoas, dentre outras questões. Atualmente, quem envia criança ou adolescente de até 18 anos para o exterior com a finalidade de obter lucro pode cumprir de quatro a seis anos de prisão, além de pagar multa. Se houver emprego de violência, a pena sobe para oito anos, somada ao tempo correspondente aos atos violentos praticados. Com a possível aprovação da PEC 171, seria considerada vítima desse tipo de crime pessoa com até 16 anos. A alteração valeria também para crimes como filmar ou fotografar menores em cenas pornográficos, cuja punição inclui multa e reclusão de quatro a oito anos. A pena aumenta se o autor do crime for agente público ou parente da vítima.Na avaliação do sociólogo Dijaci David de Oliveira, da Universidade Federal de Goiás (UFG), a aprovação da emenda pode incentivar crimes sexuais se causar alterações no ECA. “Vai ter a exploração sexual legal entre 16 e 17 anos e abrir a porta para ampliar a exploração no segmento logo abaixo, entre 14 e 15 anos, que já existe”, afirmou. Ele lembra ainda que a capacidade de fiscalização do cumprimento da lei é precária, o que agrava o problema. Em 2013, o serviço “Disque 100” da Secretaria de Direitos Humanos (SDH-PR) registrou 124.079 denúncias de violência cometidas contra criança e adolescente no país. Desse montante, 28% se referiam a violência sexual. Para Oliveira, os números mostram como, mesmo com a proteção legal, a adolescência brasileira é vulnerável.

“As coisas estão entrelaçadas. A lógica é uma só”, Carlos Ayres Britto, ministro aposentado do STF, ao alertar sobre o fato de que a redução da maioridade abre precedente para se questionar, por exemplo, o limite de idade para dirigir e votar. (Foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)


Fonte: Correio Braziliense