O ESTADO DE SÃO PAULO
Terça-feira, 3 de Setembro de 2002, 21:21 | Online
Carro roubado é usado pela Polícia Militar em SP
O comerciante Carlos Eduardo de Souza Tomé teve sua perua Santana Quantum furtada em 1996. Nunca mais a viu. O destino do carro não foi um desmanche nem o Paraguai. O veículo levado por ladrões transformou-se num carro da Polícia Militar de São Paulo. Com o número do chassi adulterado, foi pintado de cinza, cor usada pela polícia, e recebeu rádio, sirene e uma identificação: “viatura M-10290”, substituindo uma Quantum da PM que tinha sofrido um acidente.
Durante cinco anos, o veículo serviu ao capitão comandante da 2.ª Companhia do 10.º Batalhão e ao serviço reservado da unidade. Ninguém, nesse tempo, percebeu que o veículo batido, uma Quantum CL 1988, voltara da oficina como GLS, com ar-condicionado, vidros elétricos e direção hidráulica, itens que o carro comprado pela corporação não tinha.
“Antes de voltar da oficina, o carro passou por vistoria na sede do batalhão. Ninguém ia desconfiar que era produto de crime”, disse o capitão Edson de Jesus Sardano, então comandante da 2.ª Companhia e hoje secretário da Segurança de Santo André. Isso foi descoberto pelo comando do batalhão em setembro de 2001 – Sardano não estava mais na companhia.
Mesmo assim, o dono do carro não foi avisado de que a Quantum havia sido encontrada com a polícia. Isso só ocorreu hoje, quando o comerciante foi localizado pela reportagem. O carro não foi nem mesmo entregue à Polícia Civil, que deveria apreendê-lo. A ordem para que isso fosse feito estava no ofício do coronel Luciano Antonio da Silva, comandante da PM no ABC. Turbo – A história do carro furtado transformado em veículo da PM começa em 17 de agosto de 1996.
Naquele dia, a Quantum que funcionava como “viatura M-10290” se envolveu num acidente de trânsito no qual morreu “o civil Marcelo Gomes da Cruz”. O motor da Quantum havia recebido um turbo antes do acidente e, temendo a repercussão disso na imprensa, os policiais resolveram levá-la a uma oficina.
Consertar carros oficiais em oficinas particulares é praxe na polícia. Muitos donos de oficinas são amigos de policiais e fazem preços camaradas. O que se segue é a explicação dos policiais da 2.ª Companhia para o fato de a Quantum oficial ter desaparecido, sendo trocada por uma furtada. O sargento Oseias Francisco de Barros disse que apenas indicou a oficina de um amigo, Jadir Eugênio, para que o conserto fosse realizado.
Eugênio afirmou que recebeu o carro levado pelo sargento Sérgio Zagorac e pelo soldado Luiz Carlos Tenório Cavalcante, que trouxeram ainda peças de reposição e tinta. O mecânico contou ter ficado com o carro uma semana em sua oficina, quando apareceu o único policial que, segundo todos dizem, pode explicar o mistério: o soldado José Flávio Manchini.
Com um guincho, ele retirou o carro e levou-o para outra oficina junto com as peças e a tinta. Ninguém sabe para onde Manchini a levou e não há como saber, pois o soldado morreu em outubro de 2000. Os reparos foram realizados, segundo o tenente Dauri Benedito da Cruz, “a título de cortesia”.
De volta da oficina, o carro passou, conforme o regulamento, por vistoria que “visa avaliar as cores padronizadas, os sistemas de iluminação, alinhamento, parte mecânica, tapeçaria e prefixo dentro dos padrões”. Tudo conferido, o veículo ficou à disposição do comandante da companhia de 25 de feveiro de 1997 até julho de 1998, quando passou a ser usado pelo serviço reservado.
Em abril de 2000, o tenente Eduardo Carlos Farias dos Santos desconfiou dos equipamentos extras do carro e o enviou a nova vistoria, na qual ficou constatado que as alterações não haviam sido registradas. O carro foi mandado ao Instituto de Criminalística, que descobriu a adulteração do chassi.
Os peritos encontraram ainda a numeração verdadeira, o que permitiu saber que o veículo foi furtado em 2 de dezembro de 1996, no Parque da Mooca, zona leste de São Paulo. Sindicância – O comando do 10.º Batalhão instaurou sindicância sobre o caso, concluída em julho, apontando trangressões cometidas por um soldado, dois sargentos, dois tenentes e três capitães.
Um inquérito foi aberto, mas foi concluído sem que nem mesmo o comerciante Tomé fosse ouvido. O comandante do ABC não acolheu a solução da sindicância e mandou anular parte da apuração por ter sido conduzida por um tenente, Como há, em tese, capitães envolvidos no caso, no mínimo, um major deveria presidir a apuração. O coronel Silva mandou apurar responsabilidades para saber quem deve ressarcir o erário – em R$ 8.612,00 – pela perda do verdadeiro carro M-10290. Enquanto isso, o comerciante continuava sem nada saber.
Política
Publicado em sábado, 7 de setembro de 2002 às 17:58
Secretário de Sto.André autorizou turbo em viatura
Kléber Werneck
Do Diário do Grande ABC
O relatório de uma sindicância da Polícia Militar afirma que o atual secretário de Combate à Violência Urbana de Santo André, Edson Sardano, autorizou a instalação de turbo em viatura que meses depois envolveu-se em um acidente com uma vítima fatal. O documento, ao qual o Diário teve acesso, afirma ainda que o equipamento foi retirado às pressas do veículo, após a batida, para que a imprensa não tivesse conhecimento do fato e o Estado não sofresse processo judicial.
O fato aconteceu em 1996, quando Sardano era comandante da 2ª Companhia da PM de Santo André. Na madrugada de 17 de agosto, duas viaturas se chocaram com um Gol, no cruzamento entre as ruas Alegre e Tapajós, em São Caetano, o que causou a morte da tesoureira Elaine Gonçalves da Cunha, 31 anos.
Alguns meses antes, Sardano e o tenente-coronel Alberto Bertholazzi (falecido) haviam autorizado a instalação de um turbo – equipamento proibido para viaturas – no Santana Quantum prefixo M-10290, um dos carros envolvidos. A história é relatada na sindicância portaria número 10BPM-0720/11/00, instaurada para investigar a utilização de peças roubadas no automóvel após ser reformado.
No documento, o 2º Sargento Sérgio Zagorac declara em seu depoimento que pediu autorização a Sardano para colocar o turbo e que, após instalado, o veículo passou por nova vistoria do atual secretário e de Bertholazzi. Além do turbo, o texto diz que o veículo não possuía alguns acessórios obrigatórios.
Sardano admitiu ter autorizado a instalação do equipamento irregular na viatura: “Eu achei um pouco estranho, mas resolvi aprovar para deixar o motor mais moderno, pois era uma viatura que estava sendo recuperada.”
O secretário, entretanto, desvincula o uso do acessório ao acidente que vitimou a tesoureira. “A culpa não foi do turbo, quem deve explicar é quem estava dirigindo a viatura. É a mesma coisa se tivesse um saco de 1 kg de cocaína na viatura. Estaria ilegal, mas a batida não seria culpa da cocaína”, disse.
Zagorac também afirma que, após a batida, a viatura foi levada às pressas para uma oficina a fim de que o turbo fosse retirado, “pois a imprensa estava querendo registrar tal fato”. A retirada do equipamento foi confirmada pelo mecânico Alexandre Hipólito, que disse ter recebido telefonema às 5h para evitar que a “imprensa descobrisse e processasse o Estado”.
O sargento afirmou, no documento, que não sabia se a perícia havia sido realizada no veículo. O Diário teve acesso ao laudo 6803, feito pelo Instituto de Criminalística de São Bernardo e assinado pelo perito criminal Edison Makoto Adyama, que não faz nenhuma citação ao turbo.
A reportagem procurou Zagorac para comentar o assunto, mas ele disse que “não podia dar entrevista sem autorização do comando da PM”. Ele confirmou apenas que Sardano foi informado da retirada. “Todos os procedimentos são relatados ao comando”, limitou-se.
Em princípio, Sardano afirmou que estava afastado da 2ª Companhia na ocasião do acidente. Depois, disse que “devia” estar no comando, mas não se recorda com exatidão. Declarou, entretanto, “ter certeza” de que não foi informado sobre a retirada do turbo após o acidente. “Não é porque eu era o comandante que eu era responsável por tudo o que acontecia”, disse.
O tenente-coronel Wilson Silveira, atual comandante do 10º Batalhão, onde a sindicância está sendo conduzida, afirmou que “tudo está sendo apurado e quem errou será responsabilizado”. Assim como Sardano, ele desvinculou o turbo do acidente
“Memória: ‘pra’ quê te quero”? – perguntaria o atual Vereador Edson Sardano!
Enviado pelo ex-Capitão Valdir Souza