A espera de um milagre
Com tristeza, acompanho a série de reportagens do SBT que, fazendo o que outras empresas de radiodifusão por interesses financeiros se omitem em fazer, e cumprindo com a obrigação de bem informar a opinião pública, tem levado aos lares do Brasil, a real situação de desmonte da centenária polícia civil do maior e mais rico estado membro da federação.
Prédios públicos destinados às repartições policiais aos pedaços. Quando em bom estado, completamente abandonados por falta de policiais. Delegacias as moscas durante o dia e guardadas a noite por vigilantes noturnos para não serem furtadas. Aqui, o rabo abana o cachorro.
Nem a médio prazo, a polícia civil se recupera do duro golpe de ser administrada ao longo de quase duas décadas por uma condução política nos “negócios” da segurança pública tão desastrosa e imprevidente.
Faltam funcionários concursados em todas as carreiras. Antes, delegados de polícia concursados, recém empossados deixavam a carreira nos primeiros meses de profissão. Fizeram escola, agora, após a exigência do nível superior, investigadores e escrivães seguem o exemplo. Como medida paliativa para superar o problema, se multiplicam no interior funcionários emprestados de prefeituras, sem compromisso com a instituição, acessando sistemas com informações sigilosas para elaboração de BO’s, como se fossem policiais. Vários municípios, onde não existe a possibilidade de empréstimo de funcionários, foram agraciados com o fechamento das delegacias a título de reengenharia da Polícia Civil, que possui hoje o mesmo efetivo de quinze anos atrás.Escrivão de Polícia, como nos bons tempos da polícia judiciária, é carreira em estado terminal.
Cartórios das unidades policiais abarrotados de inquéritos e termos circunstanciados sem providências efetivas ou com meras providências protelatórias. Centenas de inquéritos e Termos Circunstanciados parados por falta de laudos do IC ou do IML. Casos de escrivão com carga de mais de 500 inquéritos. Delegados respondendo por três e até quatro cidades. Multiplicam-se os procedimentos disciplinares na corregedoria para apuração de eventual desídia funcional em relação a procedimentos sem providências. Para evitar a evasão geral, a administração cria todo tipo de dificuldade para o policial civil se aposentar.
Situação salarial deprimente em todas as carreiras da instituição. Pior salário do Brasil para delegado de polícia de carreira.
Tampando o sol com a peneira, em breve, na segunda quinzena do corrente mês, mais uma rodada de divulgação mensal das encomendadas, comentadas e contestadas estatísticas sobre criminalidade no Estado. Prato da casa, feitas sob medida pela própria administração, sem a fiscalização e acompanhamento de nenhuma entidade da sociedade civil organizada de credibilidade no assunto, como por exemplo, o núcleo de estudos sobre violência da USP.
Agora, com a anômala e esdrúxula conduta criminosa “Morte por intervenção policial”. Coisa chique, prata da casa, se existe morte por intervenção cirúrgica, porque não por intervenção policial? Afinal de contas, tanto médico como policial, principalmente militar, o que mais fazem é salvar vidas.
Quando neste Estado houver transparência de verdade e o governo autorizar entidades civis com credibilidade a consultarem os bancos de dados criminais da SSP, vamos navegar na “Morte Suspeita”, “Tentativa de Homicídio”, “Comunicação de Óbito”, etc , confrontar suas informações com as necropsias do IML em relação aos registros de “Morte Suspeita”, com informações sobre quantidade de bloqueios de veículos nos bancos de dados da Prodesp, trabalhar em toda a série histórica na última década e descobrir o que realmente aconteceu.
O homicídio doloso no Estado, no segundo semestre do corrente ano, tem tudo para despencar. Não podemos nos esquecer do sangrento segundo semestre do ano passado, onde polícia matava bandido, que matava polícia, que matava bandido, que matava polícia, que também matava …..
Na mais completa escuridão, exatamente neste momento, a Assembléia Legislativa promove uma homenagem a Polícia Civil. Se realmente os mandatários populares deste Estado desejassem homenageá-la, nessa situação caótica em que se encontra, não mediriam esforços para pressionar o governo em disponibilizar melhores condições de trabalho e sistema remuneratório digno e compatível com a relevância social dos serviços prestados pela Polícia Civil à população.
Drª Marilda, Drº Melão, estamos mais para velório do que para vigilia.
Aqui, Polícia Civil faliu e ninguém viu
Rogo a Ele que olhe por nós e por nossos familiares que dependem de nós.