Prezado Dr. Conde Guerra,
Em meio a tantos ratos e cobras, eu sou um trouxa. Um trouxa porque não tenho aptidão para acharcar, “dar paulada” ou extorquir. Ao invés disso, tenho aptidão para trabalhar de segunda a segunda, fazendo horário de expediente de segunda a sexta-feira e fazendo “bico” nas madrugadas de sexta, sábado e domingo. Tudo isso para pagar meu apartamento popular, tentar terminar o curso de Direito, pagar os empréstimos tomados junto ao banco e criar meus filhos, dentre outras despesas.
Ao contrário de mim, vejo policiais de carreiras menos remuneradas na PC, chegar ao trabalho de Audi A3 e Honda New Civic.
Desculpe-me se parece ressentido, mas é que, de fato, eu estou mesmo ressentido. Muito ressentido. Mas o motivo de meu ressentimento não é o fato de eu ser um trouxa e não andar de carrões do ano. Muito pelo contrário, tenho orgulho de ser esse tipo de trouxa, pois meus filhos jamais precisarão visitar seu pai no Presídio Especial da Polícia Civil, pelos menos não pelos motivo$ acima.
Meu ressentimento vai mais longe e tem um fundo institucional. Institucional? É. Isso mesmo, institucional.
Estou ressentido com a Instituição Policia Civil.
Há algum tempo tenho observado um movimento político-jurídico-militar que os dirigentes de minha instituição parecem não perceber.
Esse movimento, aproveitando-se do espaço deixado pelos dirigentes da Polícia Civil Paulista, insulflou-se e deixou seu estado latente, fazendo-se perceber para indivíduos menos esclarecidos, como eu.
Depois da administração de vários ex-promotores e ex-oficiais da PM junto à Secretaria de Segurança Pública do Estado de SP, a Polícia Civil, por culpa de inúmeros dirigentes que passaram pelas cadeiras estofadas do Palácio da Polícia, deixou-se ser enfraquecida e ter sua imagem conspurcada perante a sociedade paulista.
Tudo isso parecia que ia ter um fim com a nossa greve de 2008. Aquele 16 de Outubro foi, para mim, um marco na história da Policia Civil. Eu estava lá e pude vivenciar o rancor nutrido pela Polícia Militar do Estado de São Paulo em relação a nós, bem como a altivez com pareciam se comportar ao, covardemente, disparar balas de borracha no pescoço, rosto e cabeça de nossos colegas do GOE e GARRA, que, corajosamente, impediram que uma tragédia ocorresse com a multidão de manifestantes que se dirigiram para São Paulo naquele dia.
Mas, não foi o que aconteceu! Daquele dia em diante, vi minha Instituição ser vilipendiada pelos meios de comunicação e por políticos afáveis ao crime organizado em nosso Estado. Mais do isso, notei que uma manobra radical era implementada pelo Governador do Estado para impedir que esse dia jamais se repetisse, ou melhor, impedir que nossos grupos operacionais jamais pudessem novamente defender-nos em situações como aquela.
Foi assim, que se elevou na Secretaria de Segurança Pública o Sr. Antônio Ferreira Pinto. Estranhei aquele indivíduo que chegou dizendo que resgataria a identidade de polícia judiciária da Polícia Civil, devolvendo a ela a elaboração do Termo Circunstanciado de Ocorrência, acabando com a escolta de presos e mandando os policiais do GARRA e GOE para a investigação nos DPs. É claro que essa medida tinha por objetivo enfraquecer nossos grupos operacionais, travestida de mais policiais voltados para a investigação.
Mas, não demorou muito para o Secretário mostrar sua face ao informar uma platéia de Policiais Militares sobre como somos inéptos e letárgicos.
Ficamos todos indignados.
Às pressas, alguns de nossos dirigentes elaboraram “operações” fantásticas, com amplo destaque na mídia, para mostrar ao Sr. Secretário como somos eficientes e merecemos as migalhas que nos oferecem.
Mas, nossos dirigentes não tiveram aulas de administração de empresas nem de marketing na faculdade de direito, tampouco de estratégia militar.
Não conseguiram perceber que o Ministério Público, inimigo eterno dos Delegados de Polícia, e a Polícia Militar, inimiga de toda classe policial civil, corriam por fora para apagar a incipiente chama de eficiência mostrada pela Policia Civil e devolvê-la ao limbo.
Assim, na 1ª CONSEG realizada em Brasília nos dias 27 a 30 de Agosto, conseguiram aprovar várias diretrizes para tentar tirar das Polícias Civis o monopólio da Investigação Policial. Desejam a manutenção do artigo 144 da CF tal como está, ou seja, mantendo a estética militar da polícia ostensiva, e a implantação do Ciclo Completo nas PMs dos Estados, Continuaríamos, assim, com a mazela de duas polícias e eles, militares, conseguiriam o que sempre desejaram: investigar.
Depois disso veio a velha história dos TCOs e a impetração de HC e Mandado de Segurança contra a Resolução da SSP. E não pouparam elogios ao Secretário, que é de sua mesma laia. Foi fácil constatar o que se pode esperar de Oficiais da PM, mesmo de Oficial para Oficial.
Por último, sob a batuta de um indivíduo conhecidíssimo de todos nós policiais civis, o Coronel PM Eduardo Félix, comandante da Tropa de Choque da Capital e da desastrosa ação que levou à morte a menina Eloá, o qual, juntamente com o Gaeco, do parquet paulista, numa ação inédita no interior do Estado, ocupou o morro do São Camilo da cidade de Jundiaí/SP com policiais militares da Capital, acabando com a renda das delegacias especializadas daquela cidade que, por meio da cooperação e do acharque, ajudaram a criar no interior do Estado o maior reduto de integrantes do PCC.
E vejam só: em 17/04/2008, foi necessário que a Delegacia Anti-Sequestro de Campinas entrasse no São Camilo para prender Henrique Daniel dos Santos, o Sanguinho, que era o chefe de lá na ocasião, e que debaixo do nariz dos policiais daquela cidade sequestrava e traficava sem ser importunado.
Hilário mesmo foi saber que alguns “policiais” daquela cidade ligavam para outros da anti-sequestro para “reclamar” da prisão.
Pode? Pode!!! Mas a Polícia Militar e o MP, graças à inépcia e letargia da Polícia Civil vão acabar com isso agora.
E graças a Deus que ainda existem instituições dispostas a fazer isso, mesmo que seu objetivo real seja o enfraquecimento da Polícia Civil.