Guardas alegam sofrer perseguição
Da Redação
EDUARDO VELOZO FUCCIASem autorização para portar arma de fogo durante o trabalho e com receio dos riscos à integridade física e até mesmo de morte que consideram inerentes à função, um grupo de cinco integrantes da Guarda Civil Municipal (GCM) de São Vicente acusa o comando da corporação de perseguição.
De acordo com os autores da denúncia, que pediram o sigilo de seus nomes por razões de segurança, eles passaram a ser alvo de promessas de retaliações do comandante da GCM, Paulo dos Santos Paixão, depois que impetraram habeas corpus na tentativa de obter autorização para poder trabalhar armados.
Em primeira instância, o habeas corpus foi negado e os guardas, além de continuarem desarmados, alegam que passaram a ser perseguidos. “Para o comando, nós fomos insubordinados com o ajuizamento da ação. Mas nós apenas queremos trabalhar com segurança”, disse um dos guardas.
A retaliação que este guarda e os colegas estariam sofrendo seria a de transferência para postos de trabalhos afastados. Nesses locais periféricos o policiamento é deficiente ou a sua chegada é mais demorada. Consequentemente, os marginais agem com maior facilidade.
O grupo que conversou com A Tribuna expôs fatos que considera “arbitrariedades do comandante”. Uma deles diz respeito à Ordem de Serviço (OS) nº 22, de 31 de março deste ano, na qual o comandante Paixão determina que “fica proibido a saída antecipada ou falta, ainda que justificada, sob qualquer pretexto (sic)”.
Em outra OS assinada por Paixão, de nº 24 e com data de 3 de abril de 2009, ele escala equipes para participarem de “força-tarefa” junto com a Polícia Civil. De acordo com os autoresda denúncia, essa força-tarefa atuou emblitz para reprimir o comércio de produtos piratas em uma feira na Cidade Náutica.
Segundo os guardas, esse tipo de operação tem natureza eminentemente policial e pode provocar reações no momento ou represálias futuras. Porém, enquanto os policiais civis atuam portando armas de fogo, o mesmo não se verifica aos integrantes da GCM, que acabam se sentindo vulneráveis no cumprimento do dever.
RISCOS REAIS
Outros episódios foram citados pelos guardas para exemplificar os riscos pelos quais são submetidos no exercício das funções. Um deles aconteceu na manhã de 27 de maio de 2008, no Centro Regional de Oncologia Infantil (Croi), na Vila Margarida. Assaltantes armados invadiram o local e renderam um guarda.
Com um revólver apontado para a cabeça, o integrante da GCM foi obrigado a se deitar no chão, sendo agredido com pontapés e coronhadas nas costas. A quadrilha era formada por quatro ladrões, que ainda ameaçaram atirar no guarda, em razão da sua condição profissional, caso chegasse alguém no Croi durante o roubo.
Neste ano, na madrugada de 14 de maio, um bando invadiu o Centro de Atenção Integral à Criança (Caic) Ayrton Senna da Silva, no Humaitá, e furtaram 22 computadores de uma organização não-governamental que desenvolveria um projeto social no bairro. Desarmados, três guardas que estavam no local nada puderam fazer.
Na madrugada seguinte, em provável retaliação de traficantes e usuários de drogas da Esplanada dos Barreiros contra guardas que teriam inibido o consumo de entorpecentes na área, marginais dispararam várias vezes no Centro Náutico situado no bairro e guarnecido internamente por membros da GCM.
Os autores do atentado não foram identificados. O guarda que estava no Centro Náutico escapou ileso, apesar de alguns tiros perfuraremo portão metálico do equipamento público. Por vontade própria, ninguém da GCM quer trabalhar nesse local e no Caic do Humaitá, conforme frisou o grupo que conversou com A Tribuna.
Prefeitura se defende e isenta comandante
Da Redação
A Secretaria de Transportes, Segurança e Defesa Social de São Vicente informa que cumpre rigorosamente as decisões da Justiça, que negou habeas corpus para a utilização de armas no exercício do trabalho de Guarda Civil Municipal.
A Administração lembra ainda que os guardas participam de ações conjuntas com diversas categorias da Prefeitura, como agentes de trânsito, fiscais de comércio, obras, ISS, Vigilância Sanitária e Meio Ambiente, sempre com o apoio das polícias Civil e Militar, e conselheiros tutelares.
“Assim, realizam um trabalho de apoio aos agentes de fiscalização, não necessitando de armas, já que os policiais devidamente autorizados e armados estão presentes nestas ações”, destaca nota oficial da assessoria de imprensa da Prefeitura.
Em relação às acusações contra o comandante da CGM, diz a nota que a “Secretaria de Segurança credita total confiança, tendo em vista sua experiência nos 30 anos de policial militar e 10 anos atuando na Administração Municipal, mostrando sempre total competência e honestidade durante o trabalho”.
Por fim, frisa que “não procedem as acusações de retaliação a quem quer que seja”; esclarece que o período de trabalho dos guardas funciona em sistema de escala de 12 por 36 horas, com direito a uma falta abonada por mês, programada com antecedência, e a atuação da corporação segue o que determina a Constituição Federal, quanto à finalidade de proteger bens, serviços e instalações municipais.
Advogado destaca jurisprudência do TJ
Da Redação
Representados pelo advogado Armando de Mattos Júnior, 24 guardas municipais de São Vicente impetraram habeas corpus para poder portar arma de fogo em serviço, mas o juiz Luís Guilherme Vaz de Lima Cardinale, da 3ª Vara Criminal do município, negou o pedido. Mattos, contudo, irá recorrer ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), “que já firmou jurisprudência para guardas atuarem armados”.
O mesmo advogado adotou idêntica medida em relação aos guardas municipais de Praia Grande. O habeas corpus ajuizado naquela cidade foi concedido em primeira instância e referendado por acórdão do TJ-SP. Além disso, Mattos lembrou que guardas de mais seis cidades paulistas trabalham armados com amparo de habeas corpus. São elas: Ubatuba, Valinhos, Americana, Lou- veira, Araçatuba e Jundiaí.
Porém, dezenas de cidades do País, independentemente de habeas corpus, reconheceram a necessidade de suas guardas atuarem armadas e celebraram o necessário convênio com a Polícia Federal. No Estado, alguns dos municípios que se encaixam nessa situação são Guarulhos, Campinas, Piracicaba, Osasco, Diadema, São Caetano do Sul, Paulínia e São Paulo.
“O nosso pedido não é absurdo, até porque os armamentos seriam comprados pelos próprios interessados, não impondo despesas à Municipalidade. Além disso, a arma precisa estar registrada em nome do guarda, que deve ter o curso específico de manuseio”, ponderou o advogado. Os 24 guardas que ele representa em São Vicente realizaram curso patrocinado pelo sindicado dos servidores públicos municipais.
PONTOS CONTROVERTIDOS
Na decisão que negou a concessão do habeas corpus, o juiz Cardinale observou que “a Prefeitura Municipal não pretende que os integrantes de sua guarda trabalhem armados e, portanto, não celebra convênio e nem cria mecanismos de controle e fiscalização”. No entanto, o advogado ressaltou que a própria lei de criação da GCM “admite” a hipótese de seus integrantes atuarem armados.
Sancionada em 2004 pelo exprefeito Márcio França, a Lei Complementar nº 430, logo em seu Artigo 1º, afirma que a GCM constitui-se em “corporação uniformizada, que poderá andar armada”. Em relação às várias atribuições da guarda, previstas no Artigo 3º, algumas têm caráter policial, como “colaboração nas atividades dos postos de polícia comunitária” e “detecção de armas e entorpecentes”.
Apesar disso, ao analisar pedido de um guarda para a concessão de gratificação especial pela execução de trabalho de natureza especial, com risco de vida ou saúde, o ex-diretor da Secretaria dos Negócios Jurídicos de São Vicente, Carlos Alberto Ascoli Barletta, opinou pelo indeferimento do requerimento, em 20 de abril de 2006, com um parecer que se contrapõe com a Lei Complementar nº 430, conforme avaliou Mattos.
Diz o parecer que “a guarda municipal é apenas um corpo de vigilantes treinados para a proteção do patrimônio público e maior segurança dos munícipes, sem qualquer incumbência de manutenção de ordem pública (atribuição da Polícia Militar) ou de Polícia Judiciária (atribuição da Polícia Civil)”. “Segundo a conveniência do momento, a guarda tem um papel para a Prefeitura. Mas os riscos da atividade e a necessidade do uso de arma de fogo são reais e constantes”, concluiu Mattos.
fonte: Jornal A Tribuna de Santos
sábado 27 de junho