Quarta-Feira, 08 de Outubro de 2008
O bom exemplo dos delegados
Depois de 20 dias em greve, uma das categorias da Polícia Civil de São Paulo, a dos delegados, aceitou a proposta de trégua do governo, voltou ao trabalho e decidiu discutir suas reivindicações com as Secretarias da Segurança Pública e de Gestão Pública.
“Isso era o melhor para a instituição e para a classe”, disse o líder da categoria, Sérgio Marques Roque.
Trabalhando na área de inteligência, antes da greve, ele foi um dos primeiros delegados a serem afastados de suas funções.
A decisão do presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, que deu o prazo de 48 horas para que o governo retome as negociações salariais, enfraquece as demais categorias, principalmente as dos escrivães, investigadores e funcionários técnico-científicos, bem como as entidades que representam os policiais aposentados.
Apesar de chamados de “traidores” pelos investigadores, os delegados decidiram recuar depois que algumas categorias radicalizaram o movimento paredista, aproveitando as eleições municipais para convertê-lo numa campanha política contra o governador José Serra.
“Achamos importante não fazer greve pela greve”, afirmou Roque.
Quando os trabalhos da Polícia Civil foram suspensos, os grevistas alegavam que estavam sem receber aumento real há mais de 14 anos e divulgaram um documento informando que 90% dos policiais hoje são obrigados a exercer outra profissão para completar a renda.
Escrivães, funcionários técnico-científicos e delegados pleiteavam 15% de reajuste, em 2008, mais 12%, no próximo ano, e outros 12%, em 2010.
Os delegados também defendiam o direito de escolher o delegado-geral pelo voto direto.
Em nota oficial, o governo paulista disse que essa pretensão não tinha fundamento, afirmou que concedeu aumento de 23,43% a todas as categorias policiais, no ano passado, prometeu apresentar um plano de reestruturação de carreiras e ofereceu um aumento de 4,2% no salário-base.
Segundo a Secretaria de Gestão Pública, se a reivindicação dos integrantes da Polícia Civil fosse atendida, a folha de pagamento do funcionalismo paulista, que é de R$ 7 bilhões, sofreria um acréscimo de R$ 3 bilhões.
Na tréplica, os grevistas divulgaram cópia de um relatório no qual os técnicos da Secretaria da Fazenda afirmam que os policiais civis ganham bem menos do que os policiais militares e descontam mais para o Instituto da Previdência do Estado de São Paulo (Ipesp), uma vez que o órgão não recolhe contribuição previdenciária de 5% sobre as gratificações, benefícios e demais vantagens que são pagas aos integrantes da Polícia Militar.
Com a reabertura das negociações, os delegados e o governo cederam.
Os delegados agora estão pedindo o restabelecimento da aposentadoria especial, por causa do risco da profissão; o fim das 4ª e 5ª classes, com a promoção dos delegados para a 3ª classe; e um reajuste de 15% no salário-base deste ano, deixando para discutir em outra oportunidade os aumentos pleiteados para 2009 e 2010.
Por seu lado, as Secretarias de Gestão Pública e da Segurança Pública ofereceram um reajuste de 6,2% a todos os policiais civis e propuseram a conversão das 4ª e 5ª classes em estágio probatório, além de manter a promessa de um novo plano de carreira.
Foi essa contraproposta que levou os delegados a reabrir as negociações.
Os líderes dos delegados acham que, agora, é possível chegar a um acordo com o governo.
Essa não é, contudo, a posição dos escrivães, dos investigadores, dos funcionários técnico-científicos e das associações de aposentados da Polícia Civil.
Os líderes dessas categorias decidiram manter a greve iniciada em 16 de setembro.
“A greve continua”, diz o presidente do Sindicato dos Escrivães, com apoio do presidente do Sindicato dos Investigadores.
A Polícia Civil de São Paulo não está entre as mais bem pagas do País.
Mas os policiais não podem negar à população os serviços a que ela tem direito, para pressionar o governo a atender a suas reivindicações.
Os delegados tiveram o bom senso de perceber esse fato.
Esse é o exemplo a ser seguido pelos demais grevistas.