DO SEPULTAMENTO DA "NOSSA POLÍCIA" + 1983+ Resposta

JORNAL DO BRASIL Rio de Janeiro, Domingo, 06 de abril de 1986

 

Fiel Transcrição
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O caçador de manchetes
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ROMEU TUMA: O hábil Vice-Rei continuava o profissional de imagem ilibada — que trabalhara ao lado do truculento delegado Fleury, sem se contaminar pela péssima fama do colega E que estava ao lado do Coronel Erasmo Dias na invasão da PUC paulista, mas transferindo o peso da desastrada operação para cima do Secretário de Segurança. O episódio, aliás, demonstrou como um bom artista pode se sair bem em qualquer enredo. Enquanto o canastrão Erasmo Dias atropelava os estudantes, o habilidoso Tuma reservava para si o simpático papel de fazer a triagem dos prisioneiros — depositando os inocentes, a grande maioria, nos braços agradecidos dos pais. Virou herói. Com direito a reprise. Em 79, na greve dos jornalistas, foi esse herói quem delegou aos seus auxiliares a tarefa de prender, fichar e interrogar os presos, enquanto na outra sala consolava e tranquilizava os parentes dos jornalistas
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Míriam Leitão

 

O telex de Brasília informando que o de­legado Romeu Tuma, diretor-geral da Polícia Federal, tinha convocado uma entrevista para as 19 horas da última quarta-feira, dispara dentro do JORNAL DO BRASIL uma sé­rie de providências que dão a medi­da de que homem é esse Tuma — o caçador de manchetes. O editor da seção Nacional precisa garantir um espaço porque o delegado pode dar novas declarações sobre o caso do reitor Horacio Macedo. Mas antes tem que consultar a editoria Inter­nacional: a anunciada entrevista pode ter a ver com o cargueiro apreendido com armas; ou, quem sabe, com a extradição do torturador haitiano Pierre Albert. Mas que tal falar com a editoria de Economia? Afinal, é possível que o dele­gado tenha algo a dizer sobre con­trole de preços ou que queira pro­mover novas reuniões com empre­sários. E se ele tiver desbaratado uma nova rede de traficantes de drogas ou descoberto os restos de um último carrasco nazista?

 

Não era nada disso. Dessa vez, o surpreendente Tuma queria falar das ameaças líbias contra a Embaixada dos Estados Unidos em Brasí­lia. E o fez como sempre faz. Pacien­te e gentil, como na terça-feira no Rio em que respondeu dezenas de perguntas sobre o caso do reitor da UFRJ, coçou o nariz para brincar com os fotógrafos e sorriu revelan­do os dentes irregulares e separados nesta simétrica fisionomia de traços árabes. Guardou, contudo, as melhores Informações para com elas brindar as pessoas certas nos lugares certos Não há dúvida: se não tosse delegado por, vocação, Tuma seria um bem-sucedido Jornalista. O seu faro o instala sempre dentro das melhores manchetes. Nos últimos anos, a lista dos grandes acontecimentos em que ele fez o papel de mocinho é Interminável.

 

Só Magnum, talvez, conseguiu fei­tos semelhantes, mas para isso pre­cisou de uma série inteira de TV. O nosso herói prendeu o nazista Gustav Franz Wagner, em 1978, em Atibáia; desvendou uma série de sequestros de filhos de gente famo­sa em São Paulo no começo dos anos 80; encanou o empresário. Mário Tieppo, em 82; trancafiou o mafioso Tomaso Buschetta; comandou a operação contra o tráfico de drogas, a Operação Eccentric; es­clareceu o sequestro do empresário José Mindlin; descobriu as fraudes contra o INAMPS; desenterrou Mengele e fez as pazes com o reitor Macedo.

 

Atento à omnipresença do delegado, o ministro do Trabalho, Almir Pazzianotto, deu um conselho em uma roda de economistas do Plano de Inflação Zero, da qual participava o ministro João Sayad:

 

— Acho melhor vocês segurarem o Tuma, porque daqui a pouco ele vai estar reunindo empresários.

 

Ninguém segurou. Dois dias depois, Tuma reunia em São Paulo um grupo de donos de supermercados já engajado na luta contra a remarcação de preços. Até onde se informa no Ministério da Fazenda, foi uma iniciativa do próprio delegado e causou um certo malestar na área. “Não ouvi propriamente queixas á participação de Tuma, só vi muita gente torcendo o nariz” conta, um economista do Governo. Quer dizer: torceram o nariz mas não abriram a boca para fazer críticas.

 

— A Polícia Federal é uma organização pequena e qualquer êxito depende essencialmente da autoridade pessoal do Tuma — esclarece o Secretário de Segurança de São Paulo, advogado Eduardo Muylaert, responsável pela aproximação final entre o Governo do Estado è o delegado que o entourage pemedebista tentou expelir há três anos dos quadros da polícia por ele encarnar o regime militar. Nada leito, Hoje, Tuma está tão integrado ao Governo paulista quanto o próprio PMDB. Para Tuma, nada como um dia depois do outro — ou alguns meses. No começo de 83, por exemplo, tentou-se armar um plano para acabar com sua carreira. Do projeto “Nova Polícia” participavam intelectuais pemedebistas e um grupo de delegados, chefiado por Maurício Henrique Guimarães Pereira. Sete meses depois, quem era afastado da chefia da Polícia Civil era o próprio delegado Maurício.

 

Em seu lugar entrava José Vidal Pilar Fernandes, um velho amigo — imaginem de quem — de Tuma. No dia da posse de Vidal, o jornalista Ricardo Kotscho publicava na Folha de S. Paulo: “O Vice-Rei Tuma — acima de tudo um político da segurança — precisou de apenas sete meses para derrubar o esquema que o havia derrubado”.

 

O hábil Vice-Rei continuava o profissional de imagem ilibada — que trabalhara ao lado do truculento delegado Fleury, sem se contaminar pela péssima fama do colega E que estava ao lado do Coronel Erasmo Dias na invasão da PUC paulista, mas transferindo o peso da desastrada operação para cima do Secretário de Segurança. O episódio, aliás, demonstrou como um bom artista pode se sair bem em qualquer enredo. Enquanto o canastrão Erasmo Dias atropelava os estudantes, o habilidoso Tuma reservava para si o simpático papel de fazer a triagem dos prisioneiros — depositando os inocentes, a grande maioria, nos braços agradecidos dos pais. Virou herói. Com direito a reprise. Em 79, na greve dos jornalistas, foi esse herói quem delegou aos seus auxiliares a tarefa de prender, fichar e interrogar os presos, enquanto na outra sala consolava e tranqüilizava os parentes dos jornalistas

 

Nas reportagens, Tuma, o brando, costuma aparecer como um inglês — sem armas Aos seus coadjuvantes, o antipático papel de carregálas — como Aparecido Calandra — ou de figurar como “bandidos”, a exemplo de Davi dós Santos Araújo, presente na lista dos torturadores da Arquidiocese de São Paulo.

 

Mas nada disso compromete a imagem de mocinho de Romeu Tuma. O ex-ministro Fernando Lyra é testemunha. Logo que assumiu o Ministério, quis demiti-lo da Superintendência da Polícia Federal “Fui pressionado pelo PMDB de São Paulo para fazer Isto”, conta Lyra. A rede de amigos de Tuma não deixou. Menos de um ano depois, Lyra entrava no gabinete do Presidente Sarney com uma lista tríplice para que o Presidente escolhesse o novo diretor-geral da Polícia Federal. Na cabeça, claro, Romeu Tuma. — Tuma tem credibilidade nacional e respaldo dentro da instituição. avalizou então Lyra.

 

Qual é afinal o segredo desse delegado acima (ou abaixo?) de qualquer suspeita? Se ele se dispusesse, nas horas vagas, a escrever um livro-manual ao estilo de “Como fazer amigos e influenciar pessoas”. seria seguramente um best-seller.

 

— Ele me conquistou pelo espirito profissional. eficiência e disciplina, confessa o ex-ministro da Justiça. “Pedi que ele não prendesse grevistas. Houve mais de 300 greves em São Paulo e ele não prendeu ninguém”.

 

Vão longe os tempos em que Tuma prendia Ilustres como Luís Ignácio Lula da Silva, Djalma Bom, o atual Secretário da Justiça de São Paulo, José Carlos Dias, e até o senador Teotônio Vilella.

 

— Hoje está tudo esquecido e Tuma assimilou a filosofia da Nova República como se fosse um dos pioneiros. Ironiza um alto funcionário do Governo que, por via das dúvidas, prefere adotar o anonimato para não ferir seu novíssimo aliado. “Ele é um gênio da estratégia de marketing”, costuma se repetir no Ministério da Fazenda referindo-se ao delegado. O Secretário de Segurança Eduardo Muylaert não esconde os argumentos: “Polícia não é só a que reprime e investiga. Às vezes um bom estrategista de marketing é um bom policial porque é preciso entender um pouco de psicologia social”.

 

Mas o forte mesmo do delegado Tuma é transformar fatos em notícias. Ele distribui aos jornalistas em que confia Informações preciosas com um invejável conhecimento de cada veículo: atualidades para os jornais, casos novelescos para as revistas, imagens para as televisões. Um exemplo: ele guardou para a TV o Início da operação Eccentric, em que seriam usadas armas pesadas e helicópteros. Um show. Ou um filme — como todos em que esse artista foi protagonista. Não importa a qualidade do enredo, nem do elenco, contanto que ele tenha o papel de herói. Aos outros o papel de vilão.

LEGALIZAR JÁ AS MÁQUINAS CAÇA-NÍQUEIS – BASTA DE CORRUPTOS E CORRUPTORES. FAÇAM DO SEU TRABALHO UMA ATIVIDADE SOCIALMENTE HONESTA.

Todos nós conhecemos, muitos sentiram na carne ou nas relações profissionais, pessoais e familiares, os efeitos devastadores da compulsividade por jogos em geral.
Muitas pessoas por predisposição, outras por influência do meio social e algumas por afecções emocionais. Enfim, há inúmeras causas pelas quais uma pessoa pode se tornar um jogador compulsivo. Entretanto, a causa mais pérfida é a indução psíquica artificialmente causada pelas máquinas virtuais, em face da necessidade de se arrebanhar maior número de compulsivos apostadores. Os mecanismos pelos quais o apostar pode levar uma pessoa a se tornar um dependente das máquinas eletrônicas é muito próximo da dependência química da bebida e drogas em geral. Tais questões são estudadas e demonstradas cientificamente pela medicina. Portanto, pela complexidade e especialidade cientifica, não cabe aqui maior aprofundamento. Como Delegado de Polícia, de forma singela, me cabe abordar aspectos legais e criminológicos dos equipamentos de jogos eletrônicos. Inicialmente, cumpre afirmar que a exploração de apostas é monopólio estatal, através da União. A loteria estatal tem como modalidades mais conhecidas a mega-sena e os bilhetes de loteria. A pessoa escolhe os números ou o bilhete, paga e aguarda, por vezes dias, pelo sorteio. O apostador comum não desfalca, de regra, de forma gravosa o seu patrimônio. No interregno entre a aposta e o sorteio experimenta prazer pelos devaneios acerca de ser o eventual “sortudo”. Mas, conscientemente, sabe que a probabilidade de ser o “grande ganhador” é quase nula. Outros apostadores, em razão de fraquezas personalíssimas, enveredam pela total imprevidência. Estes acreditam que um dia serão vencedores. Descuidam do trabalho, do estudo, não se preocupam “com o amanhã”, pois numa determinada manhã acreditam que acordarão milionários. O jogo pode causar VIOLÊNCIA, DEPENDÊNCIA E IMPREVIDÊNCIA. Assim, quaisquer modalidades de jogos envolvendo apostas é potencialmente danosa à saúde individual e à economia pública. Especialmente quando o dinheiro fica todo nas mãos de exploradores privados. O dinheiro arrecadado pelas loterias públicas, em tese, deveria retornar para o mercado, fomentando a economia, inclusive. Em tese apenas. A nossa organização estatal é ineficiente e sujeita a atos de corrupção, assim parcela do dinheiro pode não ser restituída ao meio circulante. Acabando nas contas de corruptos. Em contas no exterior, inclusive. A religião, por outros fatores, também pode causar VIOLÊNCIA, DEPENDÊNCIA E IMPREVIDÊNCIA (o fanatismo). Como, também, em determinados casos pode desfalcar o mercado de preciosa fonte de riqueza. Observando-se, exemplos, de remessa de dinheiro para o exterior. Mas a questão não é discutir as religiões como potenciais instrumentos de emprobecimento coletivo. Estas, a maioria, dão total retorno do que se arrecada em benefício coletivo. Educam, curam e propiciam conforto espiritual e sadio lazer para os seus seguidores. E não necessitam fiscalização. Qual a razão? A liberdade de crer, ou não crer, de cultuar ou não cultuar. De ser cristão romano, cristão protestante, judeu, judeu-messiânico, muçulmano, budista ou cultuar as religiões afro-brasileiras. O Estado não possui religião. E as religiões não se envolvem nos assuntos de Estado, salvo o exercício da cidadania a todos assegurados. Já devem estar perguntando: qual a relação entre jogo e religião? Apenas a fraqueza humana. De resto apenas quero demonstrar que, no passado, quando diversas religiões eram proscritas, imperava a corrupção religiosa, o pagamento de propinas, a venda de indulgências, a perseguição e a extorsão daqueles não seguidores da religião imposta ao povo. Assim, faço comparação com a exploração das máquinas eletrônicas e, por amor a verdade, devo fazer defesa daqueles que exploram os jogos deliberadamente “mantidos na ilegalidade”. A ilegalidade gera recursos para agentes públicos corruptos de todas as categorias e esferas, desde a fiscalização aduaneira ao guarda – municipal. Financia campanha políticas. Contudo, os eleitos descumprem com o prometido: fazer gestões pela legalização. Não querem perder a fonte. Os eleitos, tão-só, interferem nas nomeações de cargos que poderiam reprimir a jogatina. Os nomeados para altos cargos, por sua vez, também, se locupletam ilicitamente. Forma-se um círculo vicioso infernal. Para bancar o pagamento da propina fraudam os contadores dos caça-níqueis diminuindo-se a probabilidade de ganho. E colocam dezenas de milhares desses equipamentos no mercado. E cada vez mais sofisticados atraindo mais e mais apostadores. A Polícia acaba amarrada ao círculo vicioso. Como poucos se locupletam, os demais não reprimem com a necessária diligência os crimes mais graves. As máquinas, em qualquer local onde haja afluxo de pessoas, não escolhe apostadores. Idosos, senhoras e crianças… A máquina não escolhe apostador. Estão nas padarias, lanchonetes, bares, restaurantes e, até, farmácias nas periferias. O apostador nada ganha. O proprietário das máquinas não pode distribuir aquilo que deveria aos seus clientes. Paga para o dono do estabelecimento comercial onde são instaladas, paga para a fiscalização do comércio, paga para políticos municipais, estaduais e federais e paga… paga…e paga para os policiais. Ufa! Eita osso duro de pagar. E como faz para obter lucro? Não se paga… Não paga… não paga e não se paga para o apostador; estes deixam todo o vale e até todo o salário nas máquinas. E como é que se faz para consertar? Deixando-os livres para explorar os equipamentos. Ganhará mais quem retribuir mais aos seus apostadores. Imposto por prestação de serviço para o município por estimativa. O maquineiro, hoje bandido, se tornará empresário respeitável, respeitando os seus apostadores. Se fraudar perderá cliente… O dono da padaria locará o espaço para outro, posto não querer perder a clientela, também, das cervejas e petiscos. Além de, no caso de fraude, sujeitar-se a responsabilização criminal. Não há outra solução. Senhores empresários exijam a legalização do fabrico, comércio e exploração das suas máquinas. Deixem a ilegalidade: estão lesando o povo para enriquecer políticos, policiais e Delegados de Polícia corruptos. O mesmo para os proprietários dos Bingos. Não sou inimigo pessoal dos Senhores… Sou inimigo da corrupção sistematicamente instalada que busca, apenas, manter os jogos na ilegalidade. Os Senhores muito pagaram e pagam, então exijam providências dos maiores beneficiários. Os Senhores nunca conseguirão pagar propinas satisfazendo a todos, mesmo porque quem arrecada não repassa a maior parcela. Não observaram a lista, não fui eu – o famigerado Roberto Conde Guerra – quem a elaborou… Nunca pensei que chegasse a tanto dinheiro. Quem recebe “chuta a todos”. E depois, vem alguém como eu e lhes causa ainda maiores prejuízos; jura-se morte e se amaldiçoa da mãe aos filhos. Eu não quero o seu dinheiro não. Como nunca quis máquinas e Bingo quase na porta da minha Delegacia. Não se lembram Srs. Samuel, Célio e Jorge? Sei que muita gente já ficou com dinheiro usando o meu nome. Faz parte; dizem que é sempre para o “MAJURA”. Pouco importa. Mãos à obra: organizem-se para legalizarem seus empreendimentos, será muito mais lucrativo devolver metade das apostas para a clientela, pagar pela locação do ponto e o imposto sobre prestação de serviços. Façam das suas máquinas instrumentos de diversão, deixando de empregá-las como instrumento para roubar o povo e enriquecer agente público corrupto. Ganharão um grande defensor se devolverem, apenas, metade do montante das apostas para os seus clientes. Não necessitarão da compra de laudos periciais, pareceres de juristas e liminares. E estou certo: além de dignos ficarão mais ricos. Pra que dar dinheiro, tomado do povão, entregando para politicalha e policial sem palavra… sem honra…sem vergonha na cara. E os Senhores sabem que eu estou com a razão. Quem recebe não lhes dá garantia; e vocês aceitam quaisquer incompetentes. Se um dia, por uma infelicidade que jamais lhes desejaria, um dos seus entes queridos necessitar de Policial honesto em que porta irá bater? Não quero me proclamar honesto, mas na minha poderão bater. Eu os atenderei e cumprirei os meus
deveres com total diligência e humanidade.