
Mais falso do que nota de três reais
O outro lado de uma ocorrência que o coronel nunca narrará: ou quando o policial morto é investigado pela própria corporação como ladrão!
Era uma vez, no longínquo ano de 1998, numa pobre circunscrição policial dos confins de São Vicente.
No meio da tarde, a rádio sacode o ambiente com sucessivos pedidos de reforço: um possível sequestro e iminente confronto entre marginais e a Polícia Militar da Ciª local agitam a área.
Como ainda eram bons tempos em que uma polícia copiava o rádio da outra, acorreram ao local dúzias de viaturas ; desde a polícia florestal até o Garra da Seccional de Santos , além de rondas de distritos da cidade.
Só não havia ronda na “nossa” Circunscrição , pois ainda não recebêramos uma nova viatura , ou melhor , uma viatura velha de outro DP mais importante , melhor aquinhoado com uma novinha .
Verdadeiramente, era assim que funcionava para os patinhos feios.
Pois bem , tal acontecimento se deu uma semana depois do triste homicídio de um policial rodoviário na Via Anchieta , região de Cubatão, possivelmente na perigosa cota 200. Diga-se, uma pessoa muito querida na comunidade local e policial ; bastante alegre! Alguém que aparentava estar de bem com a vida.
Estranhamente, uma equipe , ou melhor , uma Cia inteira do reservado do Batalhão de São Bernardo do Campo – um pessoal com estilo muito mais para bandidos do que qualquer outra coisa que lembrasse serem policiais – fez uma incursão na “nossa” área para investigar o crime.
A “nossa” é modo de falar, pois nunca fui dono de fazendinha!
Absurdamente, segundo eles – o tal “reservado que mais parecia de uma latrina” – o policial rodoviário – morto em serviço de rotina – era ladrão de cargas e tinha sócios caminhoneiros no bairro em que residia.
E chegaram chegando na casa do caminheiro como se fossem os proprietários da região , mas cuja esposa , muito assustada , passou a gritar para a vizinhança chamar a polícia pois estavam sendo assaltados .
Polícia…polícia…190…190 …Tem bandido querendo invadir a minha casa…
O marido , acho que um Sérgio de tal , atrás de um portão de ferro – o cavalo mecânico era guardado em seu quintal – pegou uma espécie de escopeta velha para se defender dos assaltantes.
Qual o quê, só não morreu em razão da pronta chegada dos policiais da Cia do, então , distante bairro de São Vicente.
E não houve troca de tiros por mera sorte!
O que se viu depois foi o espancamento do dono da casa, ofensas morais à esposa e tortura de um rapaz – um técnico de eletrônica pessoa ilibada – que estava instalando um computador para o filho do dono da casa.
Foi humilhado e violentado!
Depois de toda barafunda de amadores da polícia militar metidos a investigadores , se apresenta ao DP um flagrante de formação de quadrilha , com base nos componentes eletrônicos , bem vagabundos , sem nota, de um único computador , além de uma caixa de cadernos escolares e a escopeta improvisada .
Na época praticamente todo caminhoneiro levava consigo na cabine uma escopeta, coisa do tipo feita na serra e esmeril .
A ocorrência foi apresentada por um jovem Tenente bem falante , acho que meio loiro , desses faladores que até espumam pelo canto dos lábios, simpático , etc. e tal , com quem conversei por um bom tempo , até que uma equipe de outro distrito pediu licença para conversar comigo .
Ele se retirou educadamente para atendermos os investigadores de um DP da sede do município.
O assunto : uma carta precatória que estavam cumprindo acabou resultando na apreensão de mercadorias vencidas em determinado estabelecimento.
Algo praticamente irrelevante, pelo que me pediram se poderiam ser atendidos preferencialmente , pois era uma mera averiguação e não demandaria tempo e precisavam retornar urgentemente a Unidade de origem .
Deveriam atender uma prioridade!
Obviamente, determinamos a lavratura do boletim pertinente a apreensão .
Nada mais por algo nada demais !
Em seguida, retornando ao flagrante de “formação de quadrilha” , depois de analisar bem os fatos e determinar a fotografação dos “elementos” , deliberei que não se tratava de nenhuma prisão por crime flagrante; nem mesmo sequer a suposta resistência , pois nas circunstâncias se fosse levar a ferro e fogo teria que elaborar uma ocorrência em desfavor dos policiais militares pelo manifesto abuso de autoridade , invasão de domicílio e eventual tortura ( vigente desde 1997 ) .
Cabe considerar que antes da nossa conclusão, o Tenente ficou um bom tempo na minha sala degustando cafezinho e água mineral , na conversação , embora a tensão do oficial , até perguntei se ele conhecia o meu cunhado , um Capitão da rodoviária que serviu no mesmo batalhão, em que ele servia , até pouco tempos antes .
Embora o papo respeitoso e descontraído da minha parte, o tenente – diga-se bem almofadinha do tipo moderninho com roupas de grife , próprias de jovens que não tem muitas despesas domésticas ( filhinho de papai ) – ao saber que não haveria flagrante foi embora; sem se despedir diante do resultado que, aparentemente , lhe foi insatisfatório.
Segundo um indiscreto cabo , ele não se conformou por não ser um flagrante de “formação de quadrilha” . E saiu esbravejando que faria “parte” !
Certamente, não pode justificar as verbas reservadas gastas com as diligências, né?
Eu respondi, ao Cabo , algo assim: ele queria que eu ressuscitasse o policial morto já que vocês dizem que ele era ladrão?
E mesmo assim não formaria o número necessário , salvo também fosse prender a esposa e o filho criança do caminhoneiro.
Coisas de Oficial PM, ou não?
Do Burro Branco!
Mais não ficou só nisso , não demorou 30 dias fui chamado à Corregedoria do Juiz da Polícia Judiciária e na Seccional.
O Tenente , do tipo bacharel em direito , para aparecer ou para se livrar de eventuais responsabilidades , fez uma parte de umas 30 laudas.
Muitas palavras , muitas mentiras!
E com a nada original: “ o delegado se trancou com uma equipe de policiais civis e depois se negou a lavrar o flagrante” .
Logicamente , eu sendo eu , não perdi a oportunidade , infelizmente fui contido até pelo Juiz Corregedor , que me conhecia há muitos anos desde antes de sermos delegado.
E ninguém, desde sempre , quer se envolver com as minhas mãos de obra, elas costumam ir longe demais !
Dr. Conde, recebo documentos assim todos os dias, a gente sabe que nunca é verdade!
Guarde essas fotografias !
Infelizmente, as partes ficaram tão aterrorizadas que imploraram para que não fossem adotadas providências e nem compareceram ao IML.
Mas as fotos das lesões eu devo tê-las até hoje…
Talvez tenha prevaricado por não adotar as providências cabíveis por compaixão pelas vítimas.
Mas o que nos leva a escrever este texto é ver o Coronel “Pode Cast.” , contando seus causos heroicos nos canais de Youtube… Talvez queira ser candidato como o Derrite !
Mais um delirante tão falso do que nota de três.
Não são como o nosso saudoso Olímpio; não é possível comparação , aliás!
Verdadeiramente, não me permito analisar alguém, no caso o Coronel agora reformado , por um único fato , entretanto conhecendo a polícia como eu conheço da polícia posso até desconfiar : uma vez mentiroso sempre mentiroso.
Espero estar redondamente enganado, pois deve ter comandado gente excelente, mas , comigo , foi: Traíra!
Ou ele não gostava do meu cunhado Capitão ou não foi com a minha cara…
Mas ele vai lembrar de mim, o MALIGNO!
Rcguerra – de São Vicente
O perfil do hoje Coronel aposentado – conforme dialoga na internet – talvez seja a representação da sua juventude: midiático, ávido por reconhecimento, muitas vezes atribuindo heroísmo alheio ao próprio trabalho e enfatizando conquistas coletivas como pessoais.
Esse tipo de discurso pode inflar feitos individuais , falsos , simplificando a complexidade dos bastidores, além de possíveis aspirações político-midiáticas.
O relato, certamente pago nas redes sociais , tem todas as características de um “falastronissímo” clássico . Parte de um acontecimento bem-sucedido (que certamente aconteceu sem a sua participação), infla seu papel, minimiza a participação dos outros e vende como se fosse o herói solitário da história. É o caso de quem “conta vantagem com o trabalho alheio” ou, na linguagem policial:“goza com a pica alheia” .
Como diria o Capitão Nascimento: – O senhor é um fanfarrão, Coronel!
E repito: na ocorrência , com as pessoas – e até comigo – o senhor foi mentiroso e criminoso!

