Delegado estabelece vínculos entre acusados
“Desde o primeiro dia sabíamos do sequestro e passamos a investigá-lo, mas sem aparecer. Trabalhamos com total discrição para não colocar em risco a vida da vítima. Durante as negociações, apuramos a participação de algumas pessoas, mas deixamos de efetuar prisões porque não sabíamos onde era o cativeiro”, diz o delegado da Deas.
As primeiras pistas indicavam o envolvimento de um homem apelidado por Grilo e de policiais militares. “A partir daí, ficou evidenciado o comportamento atípico de Maduro, que trabalhava como segurança na empresa da vítima e no dia do sequestro, apesar de estar de folga, pediu para ser escalado”, revela Cunha.
Checando a vida de Maduro, a equipe da Deas chegou ao nome do soldado Marques, seu parceiro de viatura.
“Coincidentemente, levantamos que Marques financiou o carro até hoje utilizado por Anderson Aparecido Schimidt, o Grilo, que foi o elo entre os policiais militares e o bando de Mia”, acrescenta o delegado.
Pesquisas realizadas deram aos investigadores da Deas a certeza de que o informante Grilo, horas antes do sequestro, ficou próximo do local do crime e se comunicou por telefone várias vezes com o soldado Marques, com ele se encontrando antes e após o arrebatamento da vítima.
Os policiais também viram na casa de Grilo um Peugeot 307 preto, que está em nome de Ana Paula, cunhada de Mia. Em fevereiro deste ano, Mia foi preso em Praia Grande dirigindo esse carro e portando munições de fuzil. Porém, ele foi para a cadeia com nome falso, sendo logo solto. O automóvel foi restituído à dona pela Justiça.
Apesar de Ana Paula ser a proprietária do Peugeot, o carro foi comprado com o dinheiro de Mia e por ele era usado. “Ela confirmou essa situação e a devolução do veículo ao cunhado após conseguir liberá-lo. Essa acusada ainda admitiu saber do envolvimento de Mia e da sua irmã Arlete em sequestros e roubos”, informa Cunha.
Um celular usado pelos sequestradores durante as negociações do resgate, conforme o delegado, foi parar nas mãos da mãe de Ana Paula e Arlete, sogra de Mia. Ela mora no Jardim Miriam, no mesmo endereço onde está cadastrado o Peugeot, e enviou depois o telefone para parentes residentes no município de Jataúba (PE).
“Duas células, de São Vicente e do Jardim Miriam, se associaram para cometer o sequestro. O carro e o celular demonstram a ligação entre elas. Do grupo da Capital também faz parte Mael, braço direito de Mia. Ele negociou o resgate e a sua voz gravada nas ligações foi reconhecida pela sua mulher”, detalha o delegado.
Outra informação importante foi prestada por Grilo. “Ele nos confirmou informalmente que a ideia inicial da quadrilha era roubar o malote de dinheiro da empresa, mas houve a alteração do plano e ficou decidido sequestrar Cristiano. Com essa mudança, Grilo alega que foi sacado do esquema pelos parceiros”.
Falsa blitz detonou ação
Cinco homens participaram do arrebatamento da vítima, conforme as investigações. Reconhecido fotograficamente por testemunhas, Mia era um deles, usava touca e portava um fuzil. O bando ocupava um Vectra preto, produto de roubo dias antes na área do Jardim Miriam, e outro carro, tipo sedan, não identificado. O bando simulou uma falsa blitz da Polícia Federal para dominar Cristiano e algemá-lo com as mãos para trás.
Um dos sequestradores trajava terno e se passou por delegado. Os demais vestiam camiseta preta com a inscrição Polícia Federal em amarelo. Com exceção de Mia, que empunhava armamento de cano longo e grosso calibre, os demais portavam pistolas. A investida aconteceu às 5h40, em frente à distribuidora de produtos hortifrutigranjeiros de Cristiano, na Cidade Náutica, São Vicente.
Testemunha ocular da ação, o soldado Maduro nada fez e não foi importunado pelos sequestradores. “Apuramos que ele ficava dentro da empresa, em local onde tinha ampla visão de tudo, mas não podia ser visto. Curiosamente, na hora do sequestro, ele estava na frente, viu os carros do bando parados do outro lado da rua e não suspeitou de nada”, observa o delegado Carlos Alberto da Cunha.
Essa conclusão decorre do relato de testemunhas e da minuciosa análise da filmagem captada por uma câmera da distribuidora da vítima. As imagens ainda mostram outras situações altamente suspeitas, conforme a avaliação do delegado da Deas. “Quando Cristiano chegava com o seu Corsa, Maduro tira e põe o boné na cabeça cinco vezes em 27 segundos. Mal estacionou o veículo, a vítima foi abordada”.
As cenas também gravaram Poucas horas após a fuga da quadrilha, o Vectra foi abandonado parcialmente queimado na Vila Mirim, em Praia Grande, a uma quadra da base de pousos e decolagens de helicópteros da Polícia Militar. Por volta das 9 horas, houve o primeiro contato dos criminosos com a família de Cristiano. Eles anunciaram o sequestro, exigiram o pagamento de resgate e disseram que eram “profissionais”.
A quantia exigida e o valor definido ao final da negociação não foram divulgados. “Só podemos dizer que a importância inicial era exorbitante e que a quadrilha, apesar de se intitular profissional, se comportou de modo bastante amador ao simular, entre outras coisas, uma blitz policial. Desse modo, ela motivou a família de Cristiano a procurá-lo em diversas delegacias até receber o primeiro contato”, diz o delegado.
Mia e Mael já eram procurados da Justiça antes do sequestro de Cristiano. Mia tem passagens por roubo, homicídio, extorsão mediante sequestro e formação de quadrilha, entre outros crimes. Na folha de antecedentes de Mael constam passagens por homicídio e roubos, sendo ainda suspeito de praticar assaltos a condomínios de luxo em São Paulo apurados pelo Departamento de Investigações Criminais (Deic).
A captura dessa dupla é considerada fundamental para a descoberta do paradeiro da vítima e a identificação de outros participantes do crime. Cunha reconhece que a cada dia que passa aumenta a preocupação com o que possa ter ocorrido com o empresário, mas mantém uma convicção. “As investigações prosseguem até a localização de Cristiano. Só acredito em morte após a comprovação”.







