OPERADORES DO DIREITO? 2

Boa noite delegado Roberto,
 
Aqui vai um material interessante sobre a proibição de colocar nomes de pessoas vivas em prédios públicos, para conhecimento e deliberação.
 
Realmente é uma pena vermos delegados de polícia, em tese, operadores do direito confrontar os principios norteadores do direito administrativo. O ato de dar o nome de pessoas vivas a prédio públicos – ainda que parcialmente – fere os principiuos da moralidade, legalidade, interesse público e impessoalidade e culmina em ato de improbidade administrativa.
 
Se houver interesse aqui vai uma verdadeira “aula” do servidor público federal CARLOS ALBERTO SALDANHA em ato similar, que explica de maneira rica o fato cometido. Extraído de material mais extenso:
 
Saudações
 
 
 
Do Princípio da moralidade

 
Ao nomear prédios de órgãos administrativos, os quais foram construídos com dinheiro público, para prestar homenagens indevidas, os Gestores claramente comentem conduta dita pela Constituição e pela doutrina como imoral.
 
A moral como norte para a ética, ou seja, a síntese do que atualmente concebe-se como correto e justo seria o então o princípio da moralidade como pauta de atuação e conduta de todo e qualquer Administrador Público, ou como bem leciona Celso Bandeira de Mello, atuação na conformidade de princípios éticos.
 
A eticidade da convicção ideológica dos políticos é sobrebujada pela eticidade de responsabilidade dos Administradores Públicos. Assim seguindo a linha weberiana temos que o princípio da moralidade jamais poderia ser afastado do resultado da ação pública como pressuposto de sua própria responsabilidade com o povo que o escolheu.
 
O conceito trazido por Diogo de Figueiredo Moreira Neto citando Hauriou e Weber a moral administrativa é a moral de resultado, e, não somente a moral de intenção, e ainda, é caracterizada como fechada por não conter lacunas o suficiente para serem preenchidas com subjetivismo oportunista.
 
Entre os tantos elos que ligam a corrente da moralidade pública, como a lealdade, a moderação, a discrição, e economicidade, a sinceridade, todos lembrados por Oswaldo Othon de Pontes Saraiva Filho, temos como principal a boa-fé. Lucia Valle Figueiredo ressalta a ligação entre a boa-fé e a moralidade:
 
A nossa Carta, inovadamente, trouxe a moralidade como princípio expresso da Administração e, evidentemente, não poderemos dar uma conotação à moralidade sem qualquer liame com outros princípios, como o da legalidade, da impessoalidade, bem como dos princípios implícitos dentro de um Estado Democrático de Direito, como a boa-fé, umbilicalmente ligada à moralidade.

A estreita ligação entre boa-fé e moralidade resulta na proibição do Administrador utilizar leviandade de propósito na aplicação de seus deveres, como bem entende doutrinador Giacomuzzi, pois mais abrangente do que o campo legal, a moralidade tenta manter incólume a idéia comum de honestidade, assim lecionado por Maria Sylvia Zanella Di Pietro.

Bobbio esclarece que pelas lições de Weber a ação de um gestor público comprometido eticamente é a não dissociação de sua convicção com a sua responsabilidade. A prática política convicta sem responsabilidade gera o fanático que todo sabe e tudo faz, e a prática política com responsabilidade mas sem convicção leva ao cínico que em tudo quer ter sucesso.
 
A denominação de prédios públicos com nomes de pessoas físicas vivas, ao mesmo tempo mas, não no mesmo lugar, na ação do fanático e do cínico. O fanático acredita que denominar prédios com nomes de pessoas vivas pelo fisiologismo político é melhor para o Poder Público pelo simples fato dele assim o achar, e o cínico defende esta denominação, pois é o meio pelo qual mais ele tira valia de seu cargo público.

Figuras estas, a do fanático e do cínico, são moralmente desprezíveis, pois não atentam para o princípio da moralidade, não acreditam na respeitabilidade institucional, pois agem, respectivamente, sem responsabilidade em suas ações, e sem convicção ideológica em seus resultados.
 
 
Do Princípio da Legalidade

 
A Lei Federal n.º 6.454/77, mas também com cunho Nacional, pois é obrigatória a todos os entes – membros da federação, deveria ser observada pelo sodalício representado, mas não o foi.

Todas as normas legais e constitucionais foram afrontadas em seus conceitos principiológicos, sendo que a Constituição Federal Brasileira no inciso II do artigo 5º, e, no caput do artigo 37 ordena a vinculação dos atos administrativos ao princípio da legalidade.

Assim o princípio da Legalidade que atua como norte no Governo das Leis, entendido comumente como Estado de Direito, deve ser necessariamente observado.  A doutrinadora Odete Medauar bem assevera o caráter do princípio da legalidade, simplisiticamente como: A Administração deve sujeitar-se às normas legais.

O mestre Paulo Bonavides encarna com maestria a fonte originária da obrigação da Administração em respeito as normas advindas da sistematicidade jurídica, ou seja, obediência ao princípio da legalidade.
 
A Administração só cabe fazer aquilo que a Lei define, e, como a Lei define. A Lei não permite denominação de prédios públicos com nomes de pessoas físicas vivas, e assim deve ser feito. Assim em relação à Administração Pública temos a chamada legalidade estrita, Carlos Ari Sunfeld deixa clarividente.
 
Um dos maiores administrativista da atualidade, o Doutrinador Garcia de Enterría afirma categoricamente que:
“Quanto ao conteúdo das leis, a que o princípio da legalidade remete, fica também claro que não é tampouco válido qualquer conteúdo (dura lex, sed lex), não é qualquer comando ou preceito normativo que se legitima, mas somente aqueles (arts.161.1a,163 e164) que se produzem ‘dentro da Constituição’ e especialmente de acordo com sua ‘ordem de valores’ que, com toda a explicitude, expressem e, principalmente, não atentem, mas pelo contrário sirvam aos direitos fundamentais”
 
Assim a Administração Pública está a ferir preceitos legais. Na atividade administrativa com o advento do Estado Democrático de Direito tal preceito adquiriu presunção constitucional, ou seja, por caminho por de duas vias fere ao mesmo tempo preceito legal e disposição constitucional, em razão do controle conformidade constitucional.
 

Do Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público

 
A síntese da afronta aos princípios constitucionais já descritos pode ser a de quebra do interesse público. A atitude de denominar prédios públicos com nomes de pessoas vivas representa, por via direta, a própria disponibilidade do interesse público, como se este fosse algo perene ou manquebe.
 
Novamente a doutrinadora administrativista Odete Medauar esclarece o conceito de tal preposição constitucional basilar: “Segundo tal princípio, é vedado à autoridade administrativa deixar de tomar providências ou retardar providências que são relevantes ao atendimento do interesse público, em virtude de qualquer outro motivo” .
 
O dever do trato com Respública impõe aos Administradores a indisponibilidade do interesse público, por qualquer outro interesse. As palavras clarividentes do mestre Celso Antonio Bandeira de Melo lecionam sobre o dever como base de toda a atividade da Administração Pública:
 
“Na Ciência do Direito Administrativo, erradamente e até de modo paradoxal, quer-se articular os institutos do direito administrativo, – inobstante ramo do direito público – em torno da idéia de poder, quando o correto seria articula-los em torno da idéia de dever, de finalidade a ser cumprida. Em face da finalidade, alguém – a Administração Pública – está posta numa situação que os italianos chamam de ‘doverosità’, isto é, sujeição a esse dever de atingir a finalidade. Como não há outro meio para se atingir esta finalidade, para obter-se o cumprimento deste dever, senão irrogar a alguém certo poder instrumental, ancilar ao cumprimento do dever, surge o poder como mera decorrência, como mero instrumento impostergável para que se cumpra o dever. Mas é o dever que comanda toda a lógica do Direito Público”.
 
O ferimento do princípio da indisponibilidade pública está configurado pela não demonstração exaustiva da sua existência, pois justificar de forma leviana e simplória, algo complexo e profundo e negar a sua essência existencial.
 
 
Do Princípio da Impessoalidade
 

É tão emblemática a quebra no princípio constitucional em epígrafe no caso em tela que Carmem Lúcia Antunes Rocha, se utiliza de situação análoga à que está em tela para representar a existência de quebra da impessoalidade:
 
“A impessoalidade administrativa é rompida, ultrajando-se a principiologia juridico-administrativa, quando o motivo que conduz a uma prática pela entidade pública não é uma razão jurídica baseada no interesse público, mas no interesse particular de seu autor. Este é, então, motivado por interesse em auxiliar (o que é mais comum) ou beneficiar parentes, amigos, pessoas identificadas pelo agente e que dele mereçam, segundo particular vinculação que os aproxima, favores e graças que o Poder facilita, ou, até mesmo, em prejudicar pessoas que destoem de seu círculo de relacionamentos pessoais e pelos quais nutra o agente público particular desafeição e desagrado.”
 
Sérgio Buarque de Holanda já retratou que a história brasileira é farto de casos de uso do Estado como meio de concreção da impessoalidade:
 
“Falta a tudo a ordenação impessoal que caracteriza a vida no Estado burocrático. (…) No Brasil, pode dizer-se que só excepcionalmente tivemos um sistema administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a interesses objetivos e fundados nesses interesses. Ao contrário, é possível acompanhar, ao longo de nossa história, o predomínio constante das vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos fechados e pouco acessíveis a uma ordenação impessoal.”
 
O romper com toda a tradição brasileira de alcunhar atos administrativos como benesse pessoal precisa ser dado, sobretudo agora, com a idéia de governabilidade ligada a idéia de controle de gestão, é necessário que o bem público seja tratado com a devida impessoalidade.
 

Da Improbidade Administrativa

 
Os atos que atentam contra os princípios da administração pública estão expressos no art. 11, da Lei n. 8.429 /92. A Lei pune os atos que, por ação ou omissão, atentem contra os princípios da administração, mormente os que violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições.
 
Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições”

Um Comentário

  1. Caro Dr. Guerra:

    Houve um fato curioso, ocorrido há alguns anos, em que o ex-Presidente do TRT da 2ª Região (São Paulo), Dr. José Victório Moro, foi indagado, de maneira não muito polida, por um Parlamentar, em Brasília, durante sessão da CPI que colheu provas contra outro ex-presidente do TRT, qual seja, o Juiz Nicolau dos Santos Neto.

    O Parlamentar indagou ao Desembargador José Victório Moro como ele, como Magistrado e Presidente do TRT, havia descumprido a lei e assinado o ato que dava o nome do Juiz Nicolau ao prédio do TRT.

    Além da biografia nada recomendável de Nicolau dos Santos Neto, o que se questionava era, justamente, o fato de ter sido dado nome de pessoa viva a prédio público.

    O Dr. José Victório Moro ficou atônito, apoplético, teve de reconhecer que sabia ser ilegal dar nome de pessoa viva a prédio público, mas que acabou cedendo em razão da grande pressão que recebeu, dentre outras evasivas… Enfim, “enrolou-se” sem conseguir explicar-se.

    E, assim é.

    Trata-se de uma ilegalidade que mostra a dimensão (minúscula) de nossas Instituições, lamentavelmente.

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